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Domingo - 15 de Outubro de 2017 às 21:38

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Lourembergue Alves é professor e articulista de A Gazeta
Lourembergue Alves é professor e articulista de A Gazeta

Esvaiu-se, felizmente, o tempo em que apenas pouquíssimos brasileiros tinham acesso à escola. As portas dos prédios escolares, agora, foram escancaradas para todos os setores da sociedade. Processo que se iniciou na primeira metade do século XX, e teve um grande impulso logo no começo de sua outra metade. Um número significativo de escolas foi construído durante o período burocrático-militar, ampliadas e somadas por tantas outras salas de aula erguidas na fase histórica vivida, com um crescente número de matrículas todo ano. Tal abertura, tão necessária e imprescindível, contudo, não foi, nem é seguida pela qualidade do ensino. Tanto que sempre se podem encontrar alunos que não sabem interpretar um texto simples de três linhas, embora estejam cursando anos finais do ensino fundamental. Dados de estatísticas oficiais estão cheios desses casos.

E, para agravar ainda mais este quadro, o país continua tendo dois tipos de escolas: o destinado a um grupo de privilegiados e o outro para a imensa maioria da população. Situação que não muda com o sistema de cotas. Sistema importante, porém insuficiente, tampouco fora viabilizado para diminuir a desigualdade escolar, e, mesmo se o fosse criado para tal fim, não seria capaz de cumpri-lo. Uma desigualdade que se amplia com o descuido com os prédios municipais e estaduais da rede pública de ensino, com a ausência de instrumentos para se combater a evasão escolar e a não valorização do trabalho docente.

Isto se agrava quando se percebe que o produto "vendido" pelos professores, que é o saber e o conhecer (bem como a ajuda na conquista da cidadania), se encontra entre os de classe secundária (Não deveria sê-lo, mas o é). Somado aos baixos salários dos professores. Bem mais ainda se comparado às categorias privilegiadas do serviço público, em especial aos do Ministério Público e do Judiciário. Promotores e juízes recebem como executivos da iniciativa privada, mas gozam de benefícios só possíveis na esfera pública. Pois usufruem dois meses de férias anuais, mais um recesso de 14 e 30 dias, sem horário fixo, ganham auxílios para moradia, alimentação, transportes, dinheiro para livros e computadores e ajuda para pagar a escola particular dos filhos.

Há, aqui, nítida inversão de valores, uma vez que o professorado, até pelo seu menor subsídio e a sua tarefa cotidiana, deveria ser a ele concedido à chamada bolsa livro e a bolsa computador. Até porque é impossível para os professores se qualificarem sem o contato diário com as obras literárias e cientificas. Por outro lado, ao distanciar-se dos livros, da leitura de textos escritos, o professor provoca um efeito dominó entre seus alunos. Pois estes igualmente (há exceções, claro) não se sentem atraídos pela poesia, contos, romances e, por conta disto, veem-se afastados da condição de novos leitores. E isto, sem dúvida, traz a eles próprios um prejuízo incalculável. Impedindo-os, inclusive, de lerem adequadamente as imagens refletidas também fora do texto escrito.

Daí a dificuldade de se vencer o analfabetismo no país. Analfabetismo que, segundo o estudo da Fundação Abrinq baseado em números do Pnad 2015 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), atinge 8% da população brasileira acima de 15 anos, com o Nordeste apresentando o dobro da média nacional (16,2%) e o Centro-Oeste, 5,7%, enquanto o Sul e o Sudeste têm um pouco mais de 4%. Mato Grosso se encontra entre os Estados com alta taxa de analfabetismo. Índices que afastam o país de cumprir as metas assumidas nos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU. É isto.

Lourembergue Alves é professor e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço aos domingos. E-mail: lou.alves@uol.com.br.



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