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SISTEMA PRISIONAL
Sábado - 10 de Maio de 2014 às 16:40

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Ednilson Aguiar/Secom-MT
Denilza Nunes Vital
Denilza Nunes Vital
Denilza Nunes Vital é a prova de que, de todas as formas de ressocialização, a maternidade é a maior delas. O dia 23 de agosto de 2013 ficou marcado em sua memória como o pior da sua vida. A jovem de 29 anos estava prestes a cometer um ato que sabia que era ilegal, mas achou que valeria a pena arriscar, afinal, seria apenas uma vez. Naquele dia se levantou cedo, despediu dos cinco filhos e se preparou para pegar um ônibus até Goiânia. Na bagagem, misturada a roupas e objetos pessoais, estava um pacote que viraria sua vida do avesso, a tiraria do convívio com os filhos e interromperia temporariamente o sonho de se tornar assistente social.

Os filhos de Denilza nunca passaram por nenhum tipo de dificuldade. Ela sempre trabalhou e contava com a ajuda dos parentes, a pensão do ex-marido e os benefícios de programas federais para sustentar sua grande família. Tudo ia bem, as crianças tinham uma vida confortável, frequentavam a escola e moravam em casa própria. Sua vida começou a mudar quando ficou desempregada, após perder a função de caixa de supermercado. Um dia um amigo do seu ex-namorado comentou que um rapaz que trabalhava como transportador de drogas não poderia fazer um serviço. Com medo dos filhos passarem dificuldades financeiras e atraída pelo alto valor que estava sendo oferecido, aproximadamente 8 mil reais, ela se ofereceu para fazer o papel de ‘mula’ e levar 6 quilos de drogas que seria transportada de Cuiabá para Goiânia.

No dia fatídico ela tentou ao máximo controlar o nervosismo ao beijar cada um dos filhos antes de seguir viagem. Respirou fundo, entrou no ônibus e tentou agir da maneira mais natural possível para não chamar atenção dos outros passageiros. Mas o seu autocontrole foi por água abaixo quando, ainda na saída de Cuiabá, a Polícia Rodoviária Federal entrou no ônibus para fiscalização. Assim que olhou para ela o policial notou que havia algo errado e a mandou abrir a bagagem. Saiu de lá presa, direto para a delegacia. No trajeto só pensava nos filhos e na mãe, já formulando a melhor maneira de contar a história para eles.

No presídio Ana Maria do Couto, onde cumpre pena de 7 anos e 2 meses por tráfico de drogas, ela segue sempre a mesma rotina. Todos os dias se levanta as 5h30, se arruma e desce para trabalhar na limpeza da cozinha e dos alojamentos da penitenciária. Depois de almoçar, às 11 horas, sobe para descansar e, às 14h volta para completar a sua jornada de trabalho. A reeducanda gosta do serviço pois, além de diminuir a pena, ela também distrai a cabeça e "esquece" um pouco das crianças.

Dos cinco filhos de Denilza, apenas os três mais velhos são seus de verdade. Os caçulas Ana Júlia, de 5 anos e Marcos Vinicius, de 2 anos, são filhos de sua irmã que os entregou para ela criar. A afilhada Ana tinha três anos quando a irmã separou do marido e se viu sem estrutura para cuidar de uma criança. Logo após a menina ser adotada a irmã engravidou novamente e deu à luz  Marcos, que também acabou ficando sob os cuidados de Denilza. O momento mais feliz dentro do presídio é quando sua mãe, Zirlei, leva as crianças para a visita semanal. Entre sorrisos e lágrimas ela ouve a avó narrar as aventuras dos seus pequenos. “Na frente deles me mantenho forte, mas quando vão embora desabo no choro”.

A maior preocupação hoje é garantir que os filhos sigam o caminho correto. Denilza faz questão de orientar os pequenos com os ensinamentos que sua própria mãe lhe repassou quando ela ainda era uma criança. “Ela sempre me incentivou a trabalhar para conseguir as coisas. Hoje falo para meus filhos que não compensa seguir o caminho que parece mais fácil e mais rápido, ele custa muito caro. Descobri da pior maneira possível que o nosso bem mais precioso, a liberdade, não pode ser comprada com o dinheiro”. A reeducanda chora toda vez que fala sobre os filhos, lágrimas de saudade, de arrependimento e de culpa pela separação da família. Apenas os dois mais velhos, Luis Fernando, de 12 anos e Derik Nathan, de 10, criados pela avó materna, moram juntos na mesma casa. Antônio Gabriel, que tem 9 anos e precisa de cuidados constantes de um endocrinologista por sofrer de nanismo, mora com seu ex-marido. Já os sobrinhos, filhos de coração, Ana Júlia e Marcos Vinícius, moram com o pai e o padrinho, respectivamente.

De todos os filhos, sua maior preocupação é com Luis Fernando. O garoto ficou muito revoltado com a prisão da mãe e tem dificuldades em aceitar a realidade. A avó Zirlei sempre se queixa do neto nas visitas à filha. “Ela reclama que ele não obedece, que fica só na rua, mexendo com coisas erradas. Eu converso com ele, dou bronca, ele me garante que vai melhorar, mas na outra semana volta a fazer a mesma coisa, é muito difícil”. As outras crianças são mais fáceis de controlar. “Só teve uma vez que o Derik brigou na rua com um vizinho que o mandou ir cuidar da mãe presa”. Derik e Antônio estão envolvidos em projetos da igreja. O primeiro é levado pela avó na evangélica e o outro acompanha o pai nas missas e já está fazendo a catequese. Denilza busca incentivar a religiosidade nos filhos e acha que o temor a Deus é importante para que eles continuem no bom caminho.

Dentro do presídio ela acabou construindo uma família paralela, formada pelas 18 mulheres que trabalham no mesmo setor. “Nós nos apoiamos, sabemos que precisamos umas das outras. Temos nossas discussões, mas somos unidas e acabamos nos tornando amigas”. É com o apoio das companheiras que está superando um dos momentos mais difíceis desde que foi presa.

O mês de maio está sendo particularmente complicado pois, além do dia das Mães, que era sempre comemorado com os familiares, é a primeira vez que não poderá fazer o bolo de aniversário para o seu primogênito, Luis Fernando, que completa 13 anos no dia 28.

Apesar de todas os problemas pelo qual está passando, Delniza se sente uma privilegiada por ter o apoio da família, ao contrário de muitas outras reeducandas. Um dos momentos mais complicados foi o momento de contar para a mãe tudo o que tinha acontecido. “Minha mãe sempre foi rígida com nossa educação. Senti muito alívio com o apoio dela. Ela me esculhambou, brigou muito comigo, mas ficou do meu lado o tempo todo”. Neste domingo (11.05), em que se comemora o dia das Mães, será um dia de rara alegria. Nos nove meses em que está presa será a primeira vez em que terá toda a família reunida. A primeira coisa que quer fazer neste momento, quando estiver na frente da mãe e dos cinco rebentos, é pedir perdão por tudo o que fez de errado. O seu maior sonho é ver os filhos formados, trabalhado com dignidade. Na prisão ela aprendeu que, para ser feliz não precisa de muito, apenas do amor dos filhos. “Quando sair daqui a única coisa que quero é abraçar e beijar muito cada uma das crianças”. 





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