Pai Presente resgata cidadania de crianças
A pequena Soyani Cruz, com apenas 8 anos, realizou um grande sonho no último sábado (19 de agosto): ela ganhou um novo registro de nascimento contendo o nome de seu pai, Elton Cruz. Apesar de conviver com ele diariamente e saber quem é o seu genitor, o nome dele não constava nos documentos da menina por conta de uma separação entre os pais pouco antes dela nascer. Quando a menina fez um ano eles voltaram, mas nunca conseguiram modificar o registro.
O problema frequentemente voltava à tona na hora de apresentar a certidão na escola. "Eu sempre ficava chateada, pois sabia que iriam ver que o nome do meu pai não estava lá, mesmo sabendo que ele morava comigo. Agora eu vou fazer CPF e RG, mas sem o nome do meu pai eu não quero", destacou Soyani. A mãe da menina, Neide Machado, conta que eles até tentaram refazer a certidão, mas o preço estava sempre "salgado", o que os impedia.
Foi por isso que eles procuraram o mutirão Pai Presente, realizado no dia 19 nas comarcas de Cuiabá e Várzea Grande. Somente neste dia, foram atendidas 101 famílias, sendo 64 na capital e outras 37 na cidade vizinha. Todos que compareceram tiveram o problema resolvido. Nos casos em que os pais fizeram o reconhecimento espontaneamente, os filhos já saíram com a certidão de nascimento modificada na hora e impressa de forma gratuita. Aqueles pais que tiveram alguma dúvida foram encaminhados para o exame de DNA, que também foi disponibilizado gratuitamente. Nestes casos, o resultado sairá dentro de 30 dias.
"Ações como estas, realizadas pelo Judiciário Estadual de Mato Grosso, promovem a cidadania e também resgatam a autoestima das crianças. Saber que tem um pai no registro de nascimento é muito importante para esses pequenos, pois sabemos de estudos que já demonstraram a melhora do desenvolvimento pessoal da criança quando recebe o nome do pai. Muitas vezes as crianças chegam a se sentir constrangidas quando a certidão não identifica o genitor", ressaltou a juíza diretora do Fórum de Cuiabá, Edileuza Zorgetti Monteiro da Silva.
Esse é o caso do adolescente Victor Hugo Fidalgo da Silva, de 14 anos. Quando ainda era bebê a mãe o entregou para o pai, Elysdeti de Souza, que o cria até hoje com a ajuda da nova esposa, Cintia Oliveira. "A certidão vai mudar bastante a minha vida. Todo ano a escola pede algum responsável e não tenho porque minha mãe não vem e meu pai não está com o nome escrito nos meus documentos. Dificulta a minha vida não ter o nome dele ali", explicou.
Elysdeti conta que mesmo com essa dificuldade o menino nunca deixou de estudar e teve toda a assistência que precisou. Mas sempre contando com a boa fé das pessoas. "Legalmente eu não tenho responsabilidade sobre ele e isso é ruim. Toda vez que preciso renovar a matrícula tenho que ficar insistindo na escola para que seja feita. Quando ele foi fazer a primeira comunhão foi outro problema porque a única pessoa que está registrada na certidão de nascimento nunca está presente. Victor é um menino bom e abençoado e queremos o melhor para ele, mas sabemos que sem documentação não dá para viver nesse mundo. Então quando vi no jornal que estava realizando o mutirão, achei que seria uma oportunidade que não poderíamos perder", enfatizou o pai.
Como a mãe não estava em Cuiabá para comprovar a paternidade e facilitar a inserção do nome do pai no registro do nascimento de Victor Hugo, a magistrada determinou que fosse feito exame de DNA. Assim que sair o resultado e, se for positivo, o adolescente receberá nova certidão de nascimento sem custo.
O mutirão buscou alcançar o maior número de pessoas e, assim, deu oportunidade também para um pai que está preso na Penitenciária Central do Estado (PCE). E.V.G., 19 anos, foi levado ao Fórum no dia do evento para reconhecer e registrar uma criança. Mesmo contra a vontade do pai, a mãe pediu o exame de DNA, que foi feito na sala de audiências. Ele aproveitou o momento para conhecer e dar colo para o bebê, na certeza de ser o pai. "Eu não registrei porque estava preso, mas agora posso dar meu nome para meu filho. Mas primeiro preciso esperar o resultado do DNA que ela pediu", disparou.
O juiz criminal que cuidou do caso, Bruno D'Oliveira Marques, aproveitou a oportunidade para revisar o processo do réu que está preso por assalto. Também já informou quando terá progressão para o regime semiaberto, momento em que Eduardo poderá conviver mais com o filho.
Além de Edleuza Zorgetti e Bruno Marques, outros três magistrados participaram do evento em Cuiabá - Adair Julieta da Silva, Alberto Pampado Neto e Tatiane Colombo (plantonista do final de semana). Em Várzea Grande, os juízes Jones Gattass Dias e Christiane da Costa Marques Neves foram os responsáveis pelas audiências. Toda a realização do mutirão foi acompanhada pela juíza auxiliar da Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ-MT) Jaqueline Cherulli.
O evento contou ainda com a participação de servidores do Tribunal de Justiça e das comarcas de Cuiabá e Várzea Grande. Também foi realizado com a parceria da Promotoria e Defensoria Estadual.
O Pai Presente é um projeto do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) implantado em 2010 e desenvolvido em Mato Grosso por meio da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja). Nas 79 comarcas, a realização do Mutirão foi durante toda a semana.