Da vida no crime para a busca do sonho de ser advogada
Jackeline Barbosa Paiva tem 33 anos. Mas, quando “caiu” pela primeira vez tinha apenas 19. O ano era 2004 e a prisão ocorreu por receptação de drogas. À época, cursava o Ensino Médio em Cuiabá e ficava “em cima do muro”: continuar os estudos ou entrar para o crime?
Ela conta que em casa os exemplos não eram os melhores. "Minha mãe ensinava o certo e praticava o errado, já que era desse meio. Meu irmão e irmã também. É como se não tivesse muita saída ou expectativas para mim. Quando fui presa pela primeira vez, não havia programas de ressocialização. Eu saí dois anos e quatro meses depois e a descriminação por ser ex-presidiária era muito grande para conseguir trabalho. Então, fui ladeira abaixo. Descabeçada mesmo, voltei para o meio”.
De 2004 para cá, Jackeline tentou pequenos trabalhos, casou e teve seus primeiros dois filhos, que têm atualmente 11 e 10 anos. Acabou se separando e casou novamente cerca de cinco anos depois, tendo mais dois filhos, hoje com seis e cinco anos. Ao longo desses anos, acumulou outras quatro passagens pela polícia, sendo em 2016 a última delas.
“Sou mãe de quatro filhos, estava desempregada e desesperada e meu ex-marido, que está preso, havia pedido para eu levar fermento para ele, que me daria 750 reais. Fui e, no meio dele, tinha droga. Fui presa. Fiquei seis meses no Raio 1, que é o de prisões provisórias. Depois desse tempo, fui pro Raio 2, que é o das sentenciadas”.
A pena de Jackeline é de seis anos e oito meses. Diferente das outras vezes, ela diz que entendeu que era hora de mudar. “Nas primeiras vezes, fui meio ‘terrorista’ mesmo. Eu saía da cadeia e não tinha objetivo, expectativa de vida, reinserção na sociedade, nada. Hoje, além de ter conhecido o Nova Chance, estou focada".
Ela explica que quer diminuir e não para aumentar a pena, por isso quis trabalhar no presídio. "Comecei com crochê, depois passei a distribuir marmitas nos demais raios do presídio e, pelo meu bom comportamento, após um ano e setes meses, fui indicada para o programa extramuros, que hoje significa fazer limpeza na Setasc. Estou desde o dia 16 de julho do ano passado na secretaria”, relembra.
A Fundação Nova Chance da qual Jackeline se refere é uma instituição do Governo de Mato Grosso criada por meio da Lei Complementar nº 291/2007 e institucionalizada pelo Decreto 1.478, de 29/07/2008. Um dos seus objetivos principais é a reinserção social de pessoas que estão em privação de liberdade e os egressos do Sistema Penitenciário.
Além de trabalhar rotineiramente na Setasc, o que Jackeline considera uma das metas alcançadas dentro do seu foco de mudança de vida, recentemente também conseguiu a prisão domiciliar. “O juiz acatou devido ter quatro filhos e precisar me dedicar a educação deles”, diz.
Alcançando a liberdade aos pouquinhos, o próximo passo desejado por Jackeline é a faculdade de Direito. “Eu convivi muito tempo encarcerada, tenho conhecimento de muitas leis. Sei que temos que buscar a mudança dentro do presídio. Se esperar sair, ela não vai acontecer. A mudança não acontece quando você sai. Ela acontece durante todo esse processo. Quero sair da cadeia como presidiária e entrar novamente só como advogada”.
Lute como uma mulher
A história da mulher na sociedade sempre foi marcada pela luta e a quebra de paradigmas. Até 1931, por exemplo, elas não votavam no Brasil. Apenas em 1987 foi criado o primeiro Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, no Rio de Janeiro, órgão que até hoje media as políticas voltadas ao público feminino entre sociedade civil organizada e o Estado.
Outro ponto de relevância na história é a sanção da Lei Maria da Penha, em 2006, que desde então trouxe muitas conquistas às mulheres brasileiras. A luta, no entanto, é constante.
Para mostrar mulheres comuns, como a da Jackeline Barbosa Paiva, mas que ao mesmo tempo enfrentam muitas adversidades em seu cotidiano, o que as torna mulheres incríveis, a Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania de Mato Grosso (Setasc-MT) traz durante o mês de março – sempre às sexta-feiras – perfis de diferentes personagens femininas, em atuação também em diferentes áreas no Estado.