Quase Sem Voz
Não é tarefa fácil o viver em um país democrático. Isso vale para qualquer pessoa. Independentemente do seu nível de escolaridade, de sua crença, do estar ou não filiado politicamente e da bandeira de sua agremiação partidária. Dificuldade que, aliás, é muito clara no interior de cada partido político, seja este inscrito na ala de esquerda, na de direita ou na de centro. As siglas, na verdade, a despeito de todo o discurso que utilizam, jamais tem como prática cotidiana a liberdade de opinião de seus militantes. É a partir desta premissa que se deve discutir a atual situação do deputado Bruneto dentro do PT, destituído agora do diretório regional e visivelmente isolado, cuja voz não tem eco, nem ressonância partidária.
Situação que já foi vivida por outros filiados, dentro e fora do Estado. Mas sempre iniciada e intensificada no momento em que bate de frente ao pensamento da facção dominante. Luiza Erundina de Souza viveu uma experiência desta. Tão logo se inscreveu, em 1988, às prévias petistas, com vistas a sair candidata a prefeitura de São Paulo. Isso contra a vontade de Lula da Silva, Genoíno e de José Dirceu. Trio que defendia o nome de Plínio Sampaio. Erundina saiu-se vitoriosa, assim como igualmente foi na disputa eleitoral daquele ano, e tornou a primeira mulher a se eleger chefe do Executivo da Capital. Porém, na chefia deste (1989-93), teve que “engolir” em seco os desabonos e as “críticas” do setor majoritário e moderado da legenda.
Filme que se reprisou, talvez em menor proporção, embora de maior audiência, com Heloísa Helena em 2003. Ano em que a senadora teve seu nome expurgado da lista de filiados do PT, simplesmente por ter discordado dos rumos da política do partido, especialmente com relação à condição dos servidores públicos a partir da Reforma da Previdência realizada no governo Lula.
O partido não discutiu os rumos da “nova” postura do governo, nem se transformou em um foro de debate para sondar o que pensavam suas mais variadas facções, como também não levou para discussão o conteúdo da carta de desfiliação de Vladimir Palmeira, que confessou sentir impedido de continuar filiado com a volta ao partido de Delúbio Soares, com a bênção do maior coronel petista, bem como o aval de lideranças menores.
Isso, contudo, revela a incapacidade que seus líderes têm em lidar com a pluralidade de ideias, com as leituras diferenciadas das suas. Constatação que deixa à mostra a incapacidade de diálogo e de negociação dos atuais dirigentes. Estes recusam aceitar o contraditório, e não têm a esgrima como arma político-partidária. Talvez, por esta razão, não tenham levado para plenária partidária a proposta de expulsão dos condenados no julgamento do mensalão. Preferiram fazer das próprias vontades a vontade de todos os filiados e militantes, e o pior é que ninguém os contestou ou questionou tamanha atitude. Os condenados foram até aplaudidos em encontro nacional do partido. Também, pudera, a sigla não conta mais com esgrimistas expressivos da estirpe de Hélio Bicudo e Plínio Salgado.
Personagens que os atuais “donos” da sigla não fizeram questão em manter nas suas fileiras, assim como pouca importância deram as palavras impressas do único representante da esquerda dentro do PT, Vladimir Palmeira. Outros nomes – não da esquerda, é claro - também tiveram que sair, a exemplo da professora Serys e de seu grupo. Parigatos que só beneficia os líderes petistas mato-grossenses, os quais querem continuar tendo o lote que lhes cabe da administração pública estadual. O que explica a irrelevância, no entender deles, do dossiê contra o governo, elaborado pelo deputado estadual Bruneto. Está sendo mais forte a acusação de revanche, não a possibilidade de uma avaliação da aliança PT/PMDB, que parece ser a proposta do dito parlamentar – isolado e sem voz dentro do partido, até por lhe faltar a habilidade necessária.
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.