O Real e o Irreal
De volta a sua terra, o brasileiro sente-se feliz. Tanto que ao desembarcar, procura o barzinho do aeroporto, e pede logo um cafezinho e/ou um tira-gosto. Bebida e comida com sabores bastante distintos dos encontrados lá fora. Porém, o salgado dos preços cobrados aqui o faz lembrar imediatamente do lugar onde se encontrava que, apesar da crise vivida, não faz uma xícara pequena de café custar R$ 3,90 e uma latinha de refrigerante ser vendida por R$ 4,60. Valores que destoam, e muito, da pregação do governo, a qual reafirma o controle da inflação.
Controlar poderia estar agora, associado a administrar. Verbos que, no geral, têm quase o mesmo sentido. Sobretudo quando a conversa é economia, custo de vida. Um custo que vem num processo crescente. Pois os mesmos itens adquiridos em dezembro não são pagos, hoje, pela igual quantia de dinheiro. Embora não se tenha acrescentado, ao carrinho, objeto algum. Nem deveria. Isso porque a “grana está curta”. Mal dá para bancar com as despesas imprescindíveis à sobrevivência. Daí o corte. Não apenas com o supérfluo. Mas, também, com energia e telefonia. “O comer fora”, inclusive, tende a diminuir.
Situação complicada. Porém, ainda não desesperadora. Pois o quadro econômico do país inspira certa confiança. O próprio mercado interno tem demonstrado isso. A ponto de se ter aumentado o número de trabalhadores com carteira assinada, e este pode não ser em função tão somente do deslocamento de pessoas do setor informal para o formal, uma vez que a informalidade também se elevou. Não em igual proporção do crescimento de mendigos e pedintes nas ruas e praças das cidades.
A despeito de o governo dizer que milhões de brasileiros deixaram as fileiras da miséria nos últimos anos. Ainda que não haja tanta diferença entre quem ganha R$ 70,00 e outro que tem como renda R$ 71,00. Afinal, R$ 1,00 não paga a passagem no transporte coletivo, nem cobre a despesa diária da padaria. Pois oito pãezinhos – o francês – custam R$ 1,49 no supermercado. O mesmo, aliás, que majorou os preços da margarina, leite, queijo e das frutas, etc. Certamente porque seus fornecedores igualmente remarcaram, e esta remarcação cai nas costas do consumidor final, que também arca com os impostos e taxas – embutidas, mas nem sempre repassadas para o governo, que tem a responsabilidade de convertê-las em melhorias do espaço público e em serviços destinados a população. Contrapartida nem sempre cumprida. Afinal, parte do arrecadado geralmente é desviada para a conta bancária de “um terceiro”. O que não significa aprovar a sonegação. Esta como aquela, somada a inabilidade dos gestores, contribui enormemente para o retrato atual da saúde, educação e segurança públicas.
Estampa muitíssimo diferente da que se vê lá fora. Mesmo na Europa, onde a crise instalada faz fechar as portas de empresas, aumentar a quantidade de desempregados e empobrecer os que se achavam ter dinheiro. Porém, pelo cafezinho simples e refrigerante se paga bem menos do que no Brasil. Ainda que o barzinho procurado esteja alojado em aeroportos das capitais dos Estados europeus.
Diante disso, o brasileiro tem a sensação de que desembarcou em outro país. Não o seu. Pois, quando saiu, no finalzinho da terceira semana de dezembro, o leão da inflação parecia completamente domado. Diferentemente, portanto, da certeza que tem, no exato instante de pagar a conta.
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista político, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.