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Sexta - 02 de Dezembro de 2011 às 12:20
Por: José Lacerda

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*José Lacerda é secretário-chefe da Casa Civil do Governo de Mato Grosso.
*José Lacerda é secretário-chefe da Casa Civil do Governo de Mato Grosso.
Além de toda discussão sobre segurança nacional e questões internacionais nos 150 km da faixa de fronteira entre Mato Grosso e a Bolívia tem mais um problema em discussão, mas agora interno: o conflito jurídico e político da propriedade dessa área. E o início, ainda que lento, de processo de confisco das terras de Mato Grosso essa faixa pelo Incra e o não reconhecimento dos títulos das propriedades rurais adquiridas em compra junto ao governo estadual.

O limite ocidental das possessões portuguesas foi definido pelo Tratado de Tordesilhas. O alongamento das fronteiras na direção oeste foi feito com a fusão temporária das coroas de Portugal e Espanha, até onde hoje se encontra. O primeiro limite era de 66 km, definidos pela Lei 601 de 18 de setembro de 1850. Depois passou para 100 km pelo Art. 166 da CF de 1934 e, posteriormente, a 150 km de acordo com a CF de 1937, compreendendo, ao longo da fronteira terrestre 15.719 km.

Atualmente, a faixa de fronteira atinge 588 municípios, uma população de mais de 10 milhões de pessoas, uma extensão territorial no País de aproximadamente 143 milhões de hectares. Nos 11 estados, a área corresponde a 27% do território brasileiro na fronteira com dez países. Em MT são quase 500 mil habitantes nos 28 municípios fronteiriços.

A argumentação da União é que a venda pelo governo estadual foi feita sob o regime “a non domino”, ou seja, essa venda é nula de pleno direito, inexistente, falta de consentimento do verdadeiro dono. Questão dessa envergadura leva a duas drásticas consequências: a obrigatoriedade de indenização aos proprietários, por parte do governo de MT (o que traria desequilíbrio ao orçamento estadual) e a insegurança gerada aos proprietários rurais, os quais dedicaram à vida inteira de trabalho e ser privado de seu patrimônio, cujas terras voltam ao domínio da União.

Vale lembrar que, antes do período Republicano, como todas as terras devolutas eram tidas como domínio do Brasil Imperial, não havia preocupação alguma em indagar sobre legitimidade dos títulos. Inclusive, as terras eram cedidas gratuitamente para serem ocupadas, como previa o artigo 1º da Lei nº 601, de 28/9/1850, primeira lei de terras do Brasil.

Com o advento da República, desde a promulgação da CF de 24/02/1891, ficou estabelecido em seu Artigo 64, do Título II “Dos Estados”, que “pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção do território que for indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais".

A Lei nº 2.597, de 12/9/ 1955, expressa no Artigo 2º que era considerada zona indispensável à defesa do País a faixa interna de 150 km de largura, paralela à linha divisória do território nacional, cabendo à União a sua demarcação. No art. 10, $ 2º, da mesma lei, estabeleceu que “serão respeitados os direitos dos brasileiros já proprietários de terras que ultrapassem o limite fixado neste artigo. Os notários e oficiais de registro de imóveis informarão ao Conselho de Segurança Nacional, no prazo máximo de três anos, sobre os mencionados proprietários e as áreas que já possuem em cada município da mesma faixa”.

Depois dessas definições constitucionais vieram o reconhecimento pela ratificação em vários dispositivos de Leis Federais, desde a criação da Comissão Especial de Terras de Fronteira até o Incra. Este último passou a ter competência de ratificação e reconhecimento das vendas feitas pelos estados.

Além disso, o Art. 51 Dos ADCT da CF/88 determina que sejam revistos pelo Congresso Nacional, através de Comissão Mista nos três anos, a contar da data da Promulgação, todas as doações, vendas e concessões de terras públicas com área superior a 3 mil hectares, realizada no período de 01/01/1962 a 31/12/1987. Significa que os imóveis titulados pelo Estado com data anterior a 1962 foram recepcionados e convalidados pela constituinte de 1988.

A faixa de fronteira deveria ser entendida pela União como área estratégica de segurança nacional e não de transferência do patrimônio do Estado para a União.

*José Lacerda é secretário-chefe da Casa Civil do Governo de Mato Grosso.



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