Uma Lei em Debate
A Lei Ficha Limpa ainda não saiu do papel. Ela se encontra emperrada no Supremo Tribunal Federal, cujos membros se debruçam sobre sua constitucionalidade ou não. Avaliação necessária. Imprescindível até. Acontece, no entanto, que a mais Alta Corte do país demora muito para se decidir. Isso nada tem a ver com preciosismo. Nem com cuidados. Mas, isto sim, com a morosidade. Mal que, há bastante tempo, predomina em todos os tribunais. O que traz prejuízos enormes, além de inibir a adoção de determinadas medidas ou ações que visem, por exemplo, a moralidade no trato com a coisa pública.
Não basta, porém, a existência da lei. Ainda que esta seja de toda cumprida. Mesmo assim, haverá necessidade de outras iniciativas. Iniciativas que também requer a participação da população. Exigência da própria democracia. Nesta, e não sem razão, cidadão algum pode se dá ao luxo de se descuidar de fazer sua parte. Até mesmo para cobrar que os partidos políticos saibam escolher candidatos a altura dos cargos em disputas, bem como tenham o cuidado de indicar probo e competente para compor o secretariado e o ministério.
Percebe-se, aqui, a grande responsabilidade das agremiações partidárias. Bem mais do que se possa imaginar. Pois são co-participes da administração, quer seja quando estão na oposição ou na situação. Mais ainda nesta última condição. Afinal, como integrantes da base governista, influenciam o prefeito, governador e o presidente a tomarem determinadas atitudes. Atitudes que, muitas vezes, podem pesar em uma dada campanha eleitoral. A ponto de garantir a eleição ou a reeleição de seus candidatos.
Quadro revelador. Revela também o oportunismo. Mas, no jogo político, quem é que nunca se valeu dessa postura? Recentemente, aliás, um vereador rondonopolitano chamava a atenção para a apresentação da Lei de Ficha Limpa nas Casas Legislativas, mais precisamente nas Câmaras Municipais. Chamou-se a isso de “modismo”, além de reconhecer que a dita apresentação contribui para que o parlamentar-autor caia nas “graças do eleitorado” e passe a ocupar certo “espaço na mídia”.
Situação que traz, evidentemente, dividendos eleitorais preciosos. Sobretudo porque “vende” a idéia de moralidade e de transparência. Duas características necessárias em um Estado democrático e de direito. Afinal, o regime democrático é, essencialmente, o do governo visível – onde todas as ações dos agentes públicos devem ser conhecidas da população.
Para tal não basta apenas à lei. Ainda que seja uma lei que tem origem na vontade popular, e, por conta de assinaturas, chegou ao Congresso Nacional, do qual se espalha por Câmaras e Assembléias Legislativas, mesmo que o STF sequer tenha se pronunciado a respeito da sua ou não constitucionalidade.
Decisão que, há muito, já deveria ter sido anunciada. Desde o ano passado. Particularmente pelo seu aspecto de interesse público e popular. Esta característica – se considerada – a torna relevante. Isso a transforma em matéria a ser apreciada com urgência, urgentíssima, com o cuidado técnico e político. Inexplicável, portanto, a demora de não tê-la na pauta das sessões do STF. Um pedido de vista – ainda que estrategicamente utilizado – não pode servir para engavetar a dita lei.
O engavetar que traz insegurança e contribui com o afastamento do eleitorado do jogo político. Engavetamento, no entanto, que não deve servir de óbice para que um vereador e um deputado estadual apresentem a Ficha Limpa para cargos comissionados e secretariados do município e do Estado.
Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.