CPI, responsabilizando gestores
A legislação ambiental brasileira é bastante clara sobre uso e manejo dos recursos naturais no país, sejam eles bióticos ou abióticos. Ela orienta, pontua e exige rigor quando de sua utilização. Na questão referente à construção, ampliação e manutenção de hidrelétrica ela é ainda mais exigente. Embora sendo uma legislação relativamente jovem cronologicamente falando, se comparada às legislações de outros países, ela é bem fundamentada e veio para ficar. Pois nesse item ela é incisava, clara e objetiva, fazendo com que o Brasil figure entre os países mais rigorosos do mundo no cumprimento desse quesito. Para muitos legisladores e gestores públicos, ela ainda é um grande gargalo. No entanto na prática é uma legislação básica, simples e de fácil interpretação, se não vejamos: Na Constituição Federal, lei maior do país, o artigo 225, Inciso IV - transcrito ‘exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ao meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade’.
Nesse sentido a Carta Magna do país não deixa dúvidas sobre como proceder legalmente para utilizar os recursos naturais, especialmente a construção de usinas hidrelétricas. Entende-se assim elaboração de EIA/Rima. A resolução nº 01 do Conama de 1986, Artigo 1º, Inciso XI, transcrito,‘Usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária acima de 10MW’. Nota-se aqui que há uma pequena flexibilização da lei maior do país, porém é uma resolução, subordinada à lei maior. O artigo 279 da Constituição estadual transcrito- ‘A construção de centrais termoelétricas e hidroelétricas dependerá de projetos técnicos de impacto ambiental, com a participação do conselho estadual do meio ambiente e aprovação da assembleia legislativa‘. Artigo conflitivo com a carta magna do país. ‘A Lei complementar nº 70 de 15 de dezembro de 2000, Inciso XII, transcrito,‘ Opinar sobre o licenciamento ambiental das usinas termelétricas ou hidrelétricas com capacidade acima de 30 MW, para que, obrigatoriamente, será exigida a prévia elaboração de Estudo de Impacto Ambiental (EIA), e apresentação de respectivo Relatório de Impacto Ambiental (Rima), dependendo a validade da licença de aprovação pela Assembleia Legislativa‘.
Pelo que se pode entender, a legislação estadual sobrepõe a Constituição federal, destoando literalmente de procedimentos legais para implantação e operacionalização de hidrelétricas no Estado de Mato Grosso. O conflito com a Constituição federal é tão evidente, que se tornou objeto de contestação, via ação direta de inconstitucionalidade que tramita no Supremo Tribunal Federal, movida pela Procuradoria Geral da República, solicitando a retirada do texto em vigor. O que certamente será acatado pelo Supremo Tribunal Federal. No meio da celeuma criada com a implantação de pechs no Estado de Mato Grosso, a Sema informa que existem 154 pequenas centrais hidrelétricas pontuadas no estado nos últimos dez anos, assim distribuídas: 54 em operação; 38 em fase de implantação; 21 em estudo; 30 não iniciadas; 10 paradas e 1 em fase de análise. Dessas 154 pequenas hidrelétricas somente 12 foram aprovadas pela Assembleia Legislativa, todas com capacidade acima de 30 MW, o que, de acordo com a própria Constituição estadual, as colocam na ilegalidade. Uma pergunta óbvia: por que a Sema deixou isso acontecer durante dez anos?
Romildo Gonçalves é biólogo, mestre em educação e meio ambiente, perito ambiental em fogo florestal e professor/pesquisador da UFMT/Seduc. E-mail: romildogoncalves@hotmail.com