Educação versus dengue
Nesses primeiros dois meses do ano, o número de casos de dengue no Rio de Janeiro já é dez vezes maior do que o registrado em janeiro e fevereiro do ano passado. De nada adiantaram campanhas para evitar a multiplicação do mosquito. Isso prova que dengue não é um caso de saúde pública, mas de educação. O mosquito é fruto da sujeira e do desleixo. A sujeira e o desleixo são frutos da falta de uma educação que começa em casa, onde se deve ensinar princípios de higiene, de civilidade, de urbanidade. Ensinando as crianças que só vivemos sós num deserto. Em cidade, temos vizinhos e coabitamos a mesma grande casa, que se chama Rio, Palmas ou Piripiri.
Alguns querem empurrar isso para a escola. A escola tem, sim, alguma responsabilidade, mas a principal é dos pais. Os professores podem se esforçar, mas nada faz mudar uma criança que vive numa casa em desordem, sem regras, sem princípios. No meu curso primário aprendíamos os deveres do cidadão brasileiro - o cumprimento das leis, as posturas municipais - como não fazer barulho, não jogar papel no chão, andar pelo lado direito da calçada, obedecer os sinais de trânsito, respeitar os mais velhos, ouvir as autoridades, tomar banho e cortar as unhas regularmente, escovar os dentes. Ainda que quase todos já tivéssemos esses princípios em casa, a escola insistia neles, para formar cidadãos.
As visitas às residências de amigos nos mostravam as diferenças, que iam de casas onde o assoalho estava sempre brilhando a outras onde as galinhas ciscavam no quintal abandonado. Sentíamos, pela limpeza, onde havia higiene e saúde e onde era preferível ficar distante. Do alto do hotel onde me hospedo em Ipanema, vejo boa parte dos terraços daquele que os cariocas chamam de "bairro nobre". Pois condes e condessas daquele bairro nobre armazenam lixo, móveis velhos, quinquilharias junto com piscinas abandonadas, caixas d"água abertas, no topo de muitos de seus caixotes - digo, edifícios. Sem contar com águas paradas em buracos de calçadas irregulares. Haver dengue é uma consequência previsível nesse desleixo. Vai continuar, porque é um desleixo que ninguém nota. Faz parte da nossa cultura. Mesmo com tudo o que nossos antepassados sofreram com a febre amarela, também transmitida pelo Aedes aegypti.
Alexandre Garcia é jornalista em Brasília e escreve às terças-feiras em A Gazeta. E-mail: alexgar@terra.com.br