Fica, Mauro Zaque!
Confesso que não me agrada destacar publicamente nomes de pessoas, nem mesmo quando elas são dignas de elogio e muito menos quando o sujeito merece de mim alguma crítica. Nessas ocasiões, se possível, gosto de dizer em particular o que penso. Mas a situação atual merece que eu faça uma exceção ao meu modo de agir e torne pública a minha manifestação.
É que, mais uma vez, estão tentando calar um servidor público sério, tratando de impedir que ele continue realizando o seu trabalho com decência, independência e dignidade. Refiro-me ao promotor de justiça Mauro Zaque, um dos quadros mais experientes do Ministério Público Estadual, espécie de profissional que não se conformou em “tocar” processos contra às pessoas do grupo dos três “pês” (Pedro, Paulo e Permínio), avançando contra os delitos praticados pelos ricos e poderosos. O que mais choca, fere e dói é saber que essa artimanha porca - essa vil espelunca - parta de alguém que, até há pouco tempo, se apresentava aos mato-grossenses como o paladino da moralidade pública.
Todavia, não é de hoje que malfeitor quer escolher quem irá lhe julgar. Quem não lembra do “Rei dos Fichas Sujas”, José Riva, tentando impedir a criação das varas especializadas contra o crime organizado? Quem já esqueceu das tentativas do criminoso de querer escolher, a dedo, quem poderia ou não lhe julgar?
Lembro-me que o Tribunal de Justiça estadual, ainda sob a gestão do desembargador Paulo Lessa, recebeu, em 2008, a manifestação de algumas entidades do movimento social, entre elas o MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral). Os ativistas pleiteavam a criação de estruturas no Judiciário que permitissem o processamento de “gente de bens”, no caso os integrantes do crime organizado. Geralmente, esse tipo de “cliente” do Direito Criminal sempre foi tratado com toda a delicadeza e salamaleques nos fóruns de Mato Grosso e Brasil afora. Infelizmente, essa cultura infame das elites sanguessugas e corruptas vinha sendo transferida de pai para filho desde as capitanias hereditárias.
Alguns ainda hoje o são, se forem do PSDB e a depender do juiz (tem aquele do Paraná que é tucano-mor)! Mas nesse texto isso não vem ao caso.
Pois bem.
Os deputados estaduais, comandados, naquela época, pelo “campeão brasileiro dos processados”, o ex-presidente da Assembleia Legislativa, trataram de aprovar, a toque de caixa, e na calada da noite, a Lei Complementar 313, em 16 de abril de 2008, que acabava com a criação de varas especiais para julgar crimes de “bacanas” e ações de improbidade administrativa.
Por um lado, a reação da sociedade foi rápida, e por outro, a postura dos “caititus do Riva” carecia de constitucionalidade. E assim, a tal lei foi declarada inconstitucional. Uma vitória da Justiça, do bom combate à corrupção, e de entidades como o MCCE. Antes da instalação das varas especializadas Contra o Crime Organizado, Crime Contra a Ordem Tributária e Econômica e Crimes Contra a Administração Pública etc, cadeia em Mato Grosso era apenas um “privilégio” para um outro grupo de três “pês” da sociedade mato-grossense: “preto, pobre e puta” que lotavam os presídios do estado.
Agora, nos dias atuais, quando ladrões de colarinho branco e ternos de grifes estão fazendo companhia aos “ladrões de galinhas”, aos batedorezinhos de carteira, os “bandidos comuns”, soube que estão tentando impedir o promotor Mauro Zaque de investigar figurões do governo, mas essa reação me parece mais uma confissão antecipada de culpa do que uma tática de defesa. A não ser que se use aqui aquela máxima do futebol: a melhor defesa é o ataque! E nesse caso, o jogo dos “bacanas, dos “homens de bens” é bruto e sujo. Nisso, em sua célebre frase: “a burguesia fede”, Cazuza estava certo.
Por isso mesmo, e por tantos outros motivos, eu, que sou do povão, sempre preferi me relacionar e me posicionar ao lado dos pobres, dos marginalizados, dos excluídos e injustiçados, conforme aprendi lá na década de 70, como um devoto da teologia da libertação. Assim, adoto como meus os versos de Lews Barbosa: “Gente de bem me assusta. Gente que trata o bem como um bem ostentado. Gente de bens etiquetados. Que vigia e julga os pelados. Prefiro gente, apenas. Sem penas. Gente humana com os pés na lama. Gente que tem graça, com tropeços sem trapaças”.
Torço para que o Ministério Público reflita bem o desafio que ora lhe é imposto, e preserve, na íntegra, a liberdade do citado profissional, e, inclusive, quero lembrar que ele não é o único que sofre ameaças.
Outro dia, disseram que a promotora Ana Cristina Bardusco, outra pessoa da melhor qualidade, profissional e pessoal, teria violado sigilo fiscal de algumas autoridades estaduais, inclusive familiares de um Ministro do Supremo Tribunal Federal. Gilmar Mendes reagiu rápido, ao ser comunicado dos fatos pela OAB de Mato Grosso, pedindo investigações e punições.
Uma investigação independente foi realizada pelo setor de TI da Secretaria de Fazenda, e o corpo de auditoria concluiu que não houve nenhuma violação de sigilo por parte da promotora. Resta saber, que dirá agora a OAB, que diz combater a corrupção, mas lança desconfiança contra profissional que faz isso todos os dias, com muita competência, coragem e cuidado.
Há alguns anos, quando as grandes operações policiais ainda não eram notícia de jornal, um outro grande profissional do Ministério Público, o promotor Marcos Regenold Fernandes, começou a tratar de documentos, denúncias e informações que iriam dar a luz à operação Ararath. E daquele momento em diante, a tática de mensagens cifradas usadas pelos “bandidões”, a forma de lavar dinheiro em simulações de empréstimos, além do uso do orçamento público para o crime, passou a ser compreendido pelas autoridades dedicadas às investigações.
É uma pena que um grave erro de interpretação, principalmente do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, tirou esse promotor das investigações, sob a absurda suposição de que teria envolvimento com um delinquente que era investigado. Passado algum tempo, a verdade veio à tona, e se espera que o citado promotor possa atuar novamente ao lado de seus colegas.
Dito isso, torço para que o Ministério Público do meu Estado aja com rapidez e sobriedade, não permitindo que se lancem amarras contra Mauro Zaque, Cristina Bardusco e Marcos Regenold. E que seja rápido, porque aquele episódio de impedir a investigação do Blairo Maggi no escândalo dos maquinários, além de absurdo foi demorado, causando danos à imagem dos promotores.
Antonio Cavalcante Filho, o Ceará, é sindicalista e escreve neste espaço às sextas-feiras - E-mail: antoniocavalcantefilho@outlook.com