A análise da Ficha Limpa deve levar em conta também a inadiável necessidade de o país limpar a vida pública, e a lei é eficaz instrumento em socorro à tal faxina.
A Ficha Limpa no Supremo
A um ano das eleições municipais, o perfil das candidaturas que os partidos submeterão ao crivo dos eleitores deverá ser definido a partir deste mês. Na pauta do Supremo Tribunal Federal, a Lei Complementar 135/10, a Lei da Ficha Limpa, está completando um ano ainda sob a marca da incerteza. Como se trata de eficaz filtro para banir da disputa candidatos com pregressos e notórios contenciosos com a Justiça e/ou com histórico de malfeitos na vida pública, sua validação em definitivo pelo STF, como se espera, mudará completamente o quadro de postulantes às câmaras e prefeituras do país.
É de se prever que o Supremo, enfim, convalide este diploma legal que nasceu de inédita mobilização da sociedade, na forma de um projeto de lei de iniciativa popular. São fortes os sinais de que o STF votará pela constitucionalidade da lei. Já na votação do ano passado, quando a Corte se ateve à questão da sua aplicação no pleito de 2010, cinco ministros a consideraram constitucional. Ou seja, praticamente a metade da Corte já se pronunciou favoravelmente à Ficha Limpa, evidência concreta de que a lei tem amparo na Constituição.
Duas questões, entre outras, estavam no centro da polêmica: se a Ficha Limpa poderia afastar da eleição candidatos que tivessem sido processados antes de sua aprovação, e também postulantes enredados na Justiça, mas sem sentença transitada em julgado. A tramitação da LC 135 no Congresso ajudou a aparar os excessos relativos a estes temas. No primeiro caso, ficou entendido que exigir prova de moralidade de candidatos não é providência com prazo de validade. É pressuposto constitucional para preservar a boa representatividade. A presunção da inocência não é, portanto, atropelada.
No segundo, cuidou-se de tirar do alcance da lei aqueles que tenham sido julgados apenas em primeira instância, permanecendo barrados os que tenham sentença aplicada por órgão colegiado de segunda instância. Além disso, o alijamento não significa uma segunda punição - como entendem "fichas-sujas" -, mas critério para o enquadramento na vida pública.
A análise da Ficha Limpa deve levar em conta também a inadiável necessidade de o país limpar a vida pública, e a lei é eficaz instrumento em socorro à tal faxina. As eleições têm sido o caminho para corruptos e criminosos em geral obterem salvo-condutos. Na eleição municipal de 2008, por exemplo, cerca de 30% dos candidatos a vereador na Baixada Fluminense tinham pendências judiciais. Em São Paulo, o total de postulantes à Câmara Municipal da capital enredados no Judiciário chegava a 22%. Isso em dois estados onde a vigilância da sociedade, em tese, é mais firme.
Não é difícil constatar o que resulta da tibieza no controle dos quadros partidários. No Rio, três vereadores e um deputado foram presos por ligação com grupos milicianos. Denúncias de corrupção e de invasão do Legislativo pelo banditismo se espalham pelo país. E, uma vez ungidos esses políticos pelo voto, o corporativismo que os protege se encarrega de criar barreiras para evitar que sejam afastados da vida pública. Disso são exemplos definitivos as recentes absolvições dos deputados Jaqueline Roriz (PMN-DF) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) pela Câmara, mesmo tendo sido apanhados com provas documentais em flagrante delito. Um ano depois da frustração de 2010, o país tem, agora, igualmente por intermédio do Supremo, a chance única de adotar na sua legislação eleitoral um instrumento poderoso contra os maus políticos.
A lei é poderoso instrumento contra candidatos que só querem um salvo-conduto