OPERAÇÃO CARNE FRACA
Polícia Federal deflagra operação de combate a venda ilegal de carnes Operação 'Carne Fraca' foi deflagrada na manhã desta sexta-feira (17). Segundo a PF, grandes empresas, como BRF Brasil, estão envolvidas.
A Polícia Federal (PF) cumpre, na manhã desta sexta-feira (17), 309 mandados judiciais em seis estados e no Distrito Federal. A operação, batizada de "Carne Fraca", apura o envolvimento de fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) em um esquema de liberação de licenças e fiscalização irregular de frigoríficos.
Segundo a polícia, a "Carne Fraca" é, em números, a maior operação já realizada pela PF no país. Pela manhã, funcionários do ministério foram detidos.
Veja o que se sabe até o momento:
- Agentes do governo teriam recebido propina para liberar licenças de frigoríficos
- Maiores empresas do setor são investigadas no esquema
- Ministro foi gravado em conversas
- Frigoríficos vendiam carne vencida no mercado interno e no exterior
- 1,1 mil policiais cumprem mandados: 27 são prisão preventiva e 11 de prisão temporária
As investigações chegaram às principais empresas do setor, como a BRF Brasil, que controla marcas como Sadia e Perdigão, e também a JBS, que detém Friboi, Seara, Swift, entre outras marcas.
Em contato com o G1, a JBS afirmou que não tem informação de que algum executivo seu foi preso e informou que não há operação da PF na empresa. A reportagem tenta contato com os demais citados pela Polícia Federal.
Segundo as investigações, o esquema no Paraná era comandado pelo ex-superintendente regional do Mapa, Daniel Gonçalves Filho, e pela chefe do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal (Dipoa), Maria do Rocio Nascimento, que trabalham em Curitiba.
Na casa do atual superintendente regional do Mapa, Gil Bueno, a polícia apreendeu R$ 65 mil nesta manhã. Os três são alvos de prisão preventiva.
De acordo com informações da Polícia Federal, a investigação começou porque um fiscal não aceitou ser removido quando descobriu fraudes em uma das empresas investigadas.
Em sua decisão, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, diz que o envolvimento do Ministério da Agricultura é "estarrecedor".
"(O ministério) foi tomado de assalto - em ambos os sentidos da palavra - por um grupo de indivíduos que traem reiteramente a obrigação de efetivamente servir à coletividade", afirmou.
Carne vencida
Gravações telefônicas obtidas pela Polícia Federal apontam que vários frigoríficos do país vendiam carne vencida tanto no mercado interno, quanto para exportação.
Entre produtos químicos e produtos fora da validade, há casos ainda mais "curiosos", como a inserção de papelão em lotes de frango e carne de cabeça de porco em linguiça, além de troca de etiquetas de validade.
Ministro citado
O ministro da Justiça, Osmar Serraglio, apareceu na investigação da Operação Carne Fraca. Uma conversa de Osmar Serraglio foi grampeada, em que ele conversa com o ex-superintendente regional do Mapa, a quem ele chama de “grande chefe”. O G1 tentou entrar em contato com Osmar Serraglio, mas ainda sem sucesso.
-Osmar Serraglio: grande chefe, tudo bom?
-Daniel: tudo bom
-Osmar: viu, tá tendo um problema lá em Iporã, cê tá sabendo?
-Daniel: não
-Osmar: o cara lá, que... o cara que tá fiscalizando lá... apavorou o Paulo lá, disse que hoje vai fechar aquele frigorífico... botô a boca... deixou o Paulo apavorado! Mas pra fechar rem o rito, num tem? Sei lá. Como que funciona um negócio desse?
-Daniel: deixa eu ver o que acontecendo... tomar pé da situação lá tá... falo com o Senhor (...)
O Paulo a quem eles se referem no diálogo é o empresário Paulo Rogério Sposito – um dos alvos de prisão preventiva, que é por tempo indeterminado. Em 2010, ele foi candidato a deputado federal pelo estado de São Paulo, com o nome Paulinho Larissa, conforme consta no despacho da Justiça Federal que autoriza os mandados judiciais.
De acordo com a decisão, depois de encerrada a ligação, Daniel ligou para Maria do Rocio e contou que o fiscal de Iporã, município no noroeste do Paraná, queria fechar o frigorífico Larrisa, que pertence a Sposito. Daniel pediu a Maria do Rocio que averiguasse o que estava acontecendo e que o mantenha informado.
Maria do Rocida, segundo o despacho, obedeceu a ordem e relatou que não tinha nada errado no local. A informação também foi repassada a Osmar Serraglio.
Em uma conversa com uma pessoa não identificada, Sposito foi aconselhado a falar com Maria do Rocio para trocar de fiscal, pois estaria “enchendo o saco”.
A substituição seria feita por Tadeu, “porque ele seria fácil de enrolar e dinheirista”, segundo a decisão assinado pelo juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba.
Sul, Sudeste e Centro-Oeste
Diretores e donos das empresas estariam envolvidos diretamente nas fraudes, que contavam com a ajuda de servidores do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no Paraná, Goiás e Minas Gerais.
No Paraná, há ramificações em Londrina, no norte do estado, em Castro, nos Campos Gerais, e em Foz do Iguaçu, na região oeste do estado. No Rio Grande do Sul, são cumpridos mandados nas cidades de Gramado e Bento Gonçalves, na serra gaúcha, segundo apurou o G1 RS.
Em Goiás, foram cumpridos 13 mandados judiciais em Goiânia, sendo 1 de prisão preventiva, 4 de conduções coercitivas e 8 de busca e apreensão.
Em São Paulo, são 18 mandados no total, sendo 8 de busca e apreensão, 3 de prisão preventiva, 1 de prisão temporária e 6 de condução coercitiva, todos na capital, de acordo com informações do G1 SP.
Operação nacional
A operação detectou, em quase dois anos de investigação, que as Superintêndencias Regionais do Ministério da Pesca e Agricultura do Estado do Paraná, de Minas Gerais e de Goiás atuavam diretamente para proteger grupos empresariais em detrimento do interesse público.
Mediante pagamento de propina, os agentes públicos suspeitos atuavam para facilitar a produção de alimentos adulterados, emitindo certificados sanitários sem qualquer fiscalização efetiva.
De acordo com as investigações, entre as ilegalidades praticadas no âmbito do setor público, está a remoção de agentes públicos com desvio de finalidade para atender a interesses dos grupos empresariais.
A conduta permitia a continuidade da ação fraudulente de frigoríficos e empresas do ramo alimentício que operavam fora das regras vigentes.
Em Goiás, o sistema operava de forma parecida com o paranaense e era supostamente chefiado pelo chefe local do Dipoa, Dinis Lourenço da Silva.
Em Minas Gerais, o juiz federal Marcos Josegrei da Silva afirma que as investigações foram insuficientes para aprofundar o tamanho dos atos de corrupção envolvidos.
Aproximadamente 1,1 mil policiais federais cumprem 27 mandados de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 de condução coercitiva e 194 de busca e apreensão em residências, locais de trabalho dos investigados e em empresas supostamente ligadas ao grupo criminoso.
As ordens judiciais foram expedidas pela 14ª Vara da Justiça Federal de Curitiba e estão sendo cumpridas em São Paulo, Distrito Federal, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás.
O nome da operação faz alusão à conhecida expressão popular em sintonia com a própria qualidade dos alimentos fornecidos ao consumidor por grandes grupos corporativos do ramo alimentício.
Conforme a PF, a expressão popular demonstra uma fragilidade moral de agentes públicos federais que deveriam zelar e fiscalizar a qualidade dos alimentos fornecidos a sociedade.