Rompimento de noivado não gera dano moral
A interrupção do processo de enlace matrimonial, configurado pelo rompimento do noivado, não gera direito à reparação de danos morais, haja vista o fato ter ocorrido oito meses antes da data que haveria de ser realizada a cerimônia religiosa que haviam programado. Com esse entendimento, a Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso acolheu, por maioria de votos, recurso interposto por um homem que havia sido condenado a indenizar a ex-noiva em R$ 50 mil a título de danos morais. A decisão foi nos termos do voto da primeira vogal, desembargadora Maria Helena Gargaglione Póvoas.
Ainda de acordo com a câmara julgadora, o desfecho unilateral de relacionamento de sete anos, meses antes da data que seria a do casamento, por desamor, não constitui ato ilícito ou ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana, quando, como na hipótese, representou a formalização do fim de caso por descontentamento de uma das partes.
Em Primeira Instância, o apelante havia sido condenado a pagar a indenização, as custas processuais e os honorários advocatícios, fixados em 15% sobre o valor da condenação. No recurso, aduziu não haver no ordenamento jurídico brasileiro a obrigatoriedade de respeito à promessa de casamento. Afirmou que para a reparação de eventuais danos morais, deve-se configurar ato ilícito, culpa e nexo causal. Além disso, entendeu exorbitante o valor da condenação em danos morais, requerendo a reforma da sentença singular para julgá-la totalmente improcedente e/ou a minoração do valor indenizatório.
Os argumentos do apelante foram acolhidos. Segundo a desembargadora Maria Helena Póvoas, não existe no ordenamento jurídico a figura do noivado como um compromisso já selado e que possa gerar um dano moral. “A meu sentir, o que pode é gerar um dano material, porque ele criou uma expectativa de direito em outra pessoa; e essa expectativa de direito pode ter causado prejuízo e, neste caso, acredito que essa despesa material deve ser rateada entre ambos”, salientou. Conforme a magistrada, a situação seria diferente se tivesse havido uma situação absolutamente vexatória, em que ambos fossem casados, sob o pálio de uma figura jurídica existente no ordenamento jurídico e ele tivesse outra família paralelamente, em que ele estivesse expondo a esposa. “No presente caso é uma situação atípica na qual a apelada tinha uma expectativa de direito”, complementou.
O entendimento da magistrada foi compartilhado pelo desembargador João Ferreira Filho (segundo vogal). “Não se pode condenar, sequer moralmente quanto mais juridicamente, aquela pessoa que, tendo deixado de amar ou mesmo nunca tendo amado o outro, de uma hora para outra decide que o melhor para si é deixar; não se pode sancionar a perda do afeto e o abandono sentimental, mas é possível condenar e punir aquele que, nesse doloroso processo, protagoniza ações de violência e humilhação que acaba afetando injustamente a dignidade humana da pessoa abandonada”, explicou.
Ainda de acordo com o magistrado, no caso em análise não houve golpe traiçoeiro algum, pois, embora os preparativos para o casamento, como a contratação de buffet e escolha do vestido, possam ter gerado grandes expectativas, tudo foi desfeito em momento bem antecedente à data da ruptura definitiva. “Terminar um noivado pela perda do afeto não constitui ato ilícito. Terminá-lo, por qualquer razão ou mesmo por nenhuma, mas sob circunstâncias em que um dos apaixonados inflige ao outro alguma cota de violência e humilhação, com ofensa a direitos personalíssimos, daí sim, pode surgir a pretensão indenizatória, mas, no caso, isto não se configurou”, avaliou.
Também participaram do julgamento os desembargadores Sebastião Barbosa Farias (relator), Nilza Maria Pôssas de Carvalho (terceira vogal convocada) e Sebastião de Moraes Filho (quarto vogal convocado).