“FARRA DAS LIMINARES”
MPE exclui hospitais particulares de ação contra judicialização da saúde
A recente decisão do Ministério Público Estadual de Mato Grosso (MPE) de excluir os hospitais particulares de uma ação civil pública proposta para evitar a judicialização na área da saúde demonstra claramente que o problema da questão passa pela ineficiência do Poder Público. A avaliação foi feita pelo advogado Alex Cardoso, especializado em Direito Médico, que atua em diversos procedimentos judiciais representando as unidades de saúde. Para ele, as medidas pedidas pelo MPE ao propor a ação podem reduzir o número de demandas judiciais apresentadas por aqueles que buscam atendimento.
A ação foi apresentada pelo promotor de Justiça Célio Fúrio. Ele solicitou ao Poder Judiciário a determinação de um prazo de 30 dias para que a Secretaria de Estado de Saúde (SES/MT) promova a efetiva implantação e pleno funcionamento da Câmara de Mediação e Conciliação. No mesmo prazo, deverá ser concebido um banco de preços em saúde, abrangendo serviços e insumos hospitalares, médicos e de órtese, prótese e materiais especiais, nos moldes do que já que existe no Ministério da Saúde.
Na ação, Furio pediu, em caráter liminar, o incremento em 50%, em até seis meses, da possibilidade de contratação ou contratualização de serviços de saúde, além da imediata criação de consultoria para acompanhamento do processo de liquidação da despesa, mesmo no âmbito judicial. Todos os pedidos do promotor têm a intenção de acabar com a chamada “farra das liminares”, relacionadas à judicialização da saúde.
Alex Cardoso destaca que em uma fase anterior à apresentação da ação, dois hospitais particulares de Cuiabá também foram investigados. No entanto, o promotor descartou processar as unidades de saúde, após análise do caso e oitiva de diversas pessoas. “Ao apresentar esta ação, o próprio promotor destacou que há um ‘desinteresse’ do Estado de Mato Grosso na solução das situações que levam à judicialização da saúde”, pontuou o advogado ao lembrar as constantes trocas no comando da SES ocorridas nos últimos anos.
Entre os anos de 2014 e 2016, segundo auditoria feita pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e usada pelo MPE ao apresentar a ação, o Poder Público gastou mais de R$ 222 milhões com decisões judiciais voltadas à saúde. O advogado ressalta que o valor poderia ser menor se houvesse a contratualização de serviços voltado para o atendimento de tais decisões. “Buscamos por diversas vezes este tipo de negociação. Então, não há o que se falar em responsabilização dos hospitais por esta despesa. As unidades privadas possuem uma tabela de preços, feita com base nos custos que têm com o pagamento dos profissionais, aquisição de insumos, medicamentos e outros materiais e que são repassados no preço cobrado, além de existir a questão do livre mercado”, complementa Cardoso.
A auditoria do TCE apontou para discrepância em valores de determinadas ações, fato que já foi esclarecido no pedido de providências, junto ao MPE e também à Corte de Contas, segundo Cardoso. “O mais importante nesta auditoria do Tribunal de Contas é que há uma série de irregularidades na abordagem destes casos por parte do Poder Público, como por exemplo a comprovação de negativa do atendimento por via administrativa, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), que justificaria acionar o Judiciário”.
O processo é o mais novo capítulo do caso, que se arrasta desde 2014 e foi iniciado depois que os hospitais Santa Rosa e São Mateus ingressaram com um pedido de providências junto ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) para o recebimento de valores devidos pelo Estado por conta do atendimento a estes pacientes.
Então presidente do TJ, o desembargador Orlando de Almeida Perri suspeitou de fraudes, superfaturamento e de captação de pacientes da rede pública para a rede privada pelos dois hospitais. “Eu, como patrono das duas instituições, fui duramente criticado por conta da defesa intransigente que fiz dos hospitais, mas agora as coisas começam a ficar claras”, destaca Alex Cardoso.
Diante da suspeita lançada por Perri, o MPE optou pela abertura de uma investigação que, ao final, concluiu pela inexistência de indícios de que os dois hospitais tenham cometido as irregularidades levantadas pelo magistrado. “Isso demonstra de forma clara onde está o problema que gera um volume tão alto de demandas judiciais de cidadãos que buscam atendimentos na área da saúde”, finaliza o jurista.