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POLÍTICA
Quinta - 25 de Julho de 2024 às 01:22

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@ Tomaz Silva/Agência Brasil
@ Tomaz Silva/Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta quarta-feira (24), que o combate à fome é uma escolha política dos governantes. “A fome não resulta apenas de fatores externos, ela decorre, sobretudo, de escolhas políticas. Hoje o mundo produz alimentos mais do que suficientes para erradicá-la.

“Enquanto isso, os gastos com armamentos subiram 7% no último ano, chegando a US$ 2,4 trilhões. Inverter essa lógica é um imperativo moral, de justiça social, mas também essencial para o desenvolvimento sustentável”, acrescentou o presidente no evento de pré-lançamento da força-tarefa para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, no Rio de Janeiro.

A iniciativa estabelece um compromisso internacional para obter apoio político, recursos financeiros e conhecimento técnico para implementação de políticas públicas e tecnologias sociais comprovadamente eficazes para a erradicação da fome e da pobreza no mundo. Entre as iniciativas bem-sucedidas estão experiências nacionais voltadas para os mais pobres e vulneráveis, como transferência de renda, alimentação escolar, cadastro de famílias vulneráveis, apoio à primeira infância, apoio à agricultura familiar, assistência social, protagonismo das mulheres e inclusão socioeconômica e produtiva, entre outros.

“A fome não é uma coisa natural, a fome é uma coisa que exige decisão política”, reforçou Lula. “Não é possível que, na metade do século 21, quando a gente já está discutindo até inteligência artificial, sem conseguir consumir a inteligência natural que todos nós temos, a gente ainda seja obrigado a fazer uma discussão dizendo para os nossos dirigentes políticos do mundo inteiro, ‘por favor, olhem os pobres porque eles são seres humanos, eles são gente e eles querem ter oportunidade’”, completou o presidente.

A aliança está sendo proposta pelo Brasil no G20 e, no encontro de ministros no Rio de Janeiro, o bloco aprovou os documentos fundacionais da iniciativa, dando início à adesão pelos países. Qualquer país interessado pode aderir à aliança. O lançamento oficial será formalizado na Cúpula de Líderes do G20, em novembro, também na capital fluminense.

“A aliança representa uma estratégia de conquista da cidadania, e a melhor maneira de executá-la é promovendo a articulação de todos os atores relevantes. Nossa melhor ferramenta será o compartilhamento de políticas públicas efetivas. Muitos países também tiveram êxito em combater a fome e promover a agricultura e queremos que esses exemplos possam ser conhecidos e utilizados”, disse Lula, explicando que essa transferência de conhecimento não será imposta.

“Vamos sistematizar e oferecer um conjunto de projetos que possam ser adaptados às realidades específicas de cada região. Toda adaptação e implementação deverá ser liderada pelos países receptores, porque cada um conhece seus problemas. Eles devem ser os protagonistas de seu sucesso”, afirmou.

Financiamento

A Aliança Global contra a Fome e a Pobreza será gerida com base em um secretariado alojado nas sedes da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), em Roma, e em Brasília. Ela funcionará até 2030, quando será desativada, e metade dos seus custos será coberta pelo Brasil.

“Quero registrar minha gratidão aos países que já se dispuseram a contribuir com este esforço”, disse Lula, ao explicar que a iniciativa não criará fundos novos, mas que os recursos globais e regionais que já existem, e estão dispersos, serão redirecionados para as políticas de Estado de cada país.

Hoje, o Banco Mundial declarou apoio à aliança, colocando a segurança alimentar em sua agenda estratégica nos próximos anos. O Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Banco Africano de Desenvolvimento também anunciaram contribuições à iniciativa, com o estabelecimento de novo um mecanismo financeiro. A Associação Internacional para o Desenvolvimento também fará nova recomposição de capital para ajudar os países mais pobres.

Lula lembrou ainda que a presidência do Brasil no G20 defende a reforma das instituições de governança global, inclusive as financeiras. “A representação distorcida na direção do FMI [Fundo Monetário Internacional] e do Banco Mundial é um obstáculo ao enfrentamento dos complexos problemas da atualidade. Sem uma governança mais efetiva e justa, na qual o Sul Global [países do Hemisfério Sul] esteja adequadamente representado, problemas como a fome e a pobreza serão recorrentes”, disse.

A taxação dos super-ricos também é uma agenda proposta pelo Brasil, que está em debate no bloco. “A riqueza dos bilionários passou de 4% do PIB (Produto Interno Bruto) mundial para quase 14% nas últimas três décadas. Alguns indivíduos controlam mais recursos do que países inteiros”, disse Lula.

“Vários países enfrentam um problema parecido: no topo da pirâmide, os sistemas tributários deixam de ser progressivos e se tornam regressivos. Os super-ricos pagam proporcionalmente muito menos impostos do que a classe trabalhadora. Para corrigir essa anomalia, o Brasil tem insistido no tema da cooperação internacional para desenvolver padrões mínimos de tributação global, fortalecendo as iniciativas existentes e incluindo os bilionários”, reforçou o presidente.

Fome no mundo

Precedendo a reunião ministerial de hoje, a FAO lançou seu Mapa da Fome, segundo o qual, uma em cada 11 pessoas pode ter passado fome no mundo em 2023. No ano passado, a estimativa era que 28,9% da população mundial (ou 2,33 bilhões de pessoas) estava em moderada ou grave insegurança alimentar. Tendências crescentes de obesidade de adultos e de anemia entre mulheres de 15 a 49 anos também são consideradas preocupantes, diz a FAO.

Para Lula, os dados são “estarrecedores”, sendo a fome “a mais degradante das privações humanas”. “O problema é especialmente grave na África e na Ásia, mas também persiste em partes da América Latina. Mesmo nos países ricos, aumenta o apartheid nutricional, com a pobreza alimentar e a epidemia de obesidade”, disse o presidente, lembrando ainda que a situação é mais grave para mulheres e crianças.

“A fome tem o rosto de uma mulher e a voz de uma criança. Mesmo que elas preparem a maioria das refeições e cultivem boa parte dos alimentos, mulheres e meninas são a maioria das pessoas em situação de fome no mundo. Muitas mulheres são chefes de família, mas ganham menos. Trabalham mais no setor informal, se dedicam mais aos cuidados não remunerados e têm menos acesso à terra que os homens. A discriminação étnica, racial e geográfica também amplifica a fome e a pobreza entre populações afrodescendentes, indígenas e comunidades tradicionais”, afirmou Lula.

Programas que colocam a mulher como componente central das ações também deverão fazer parte da cesta de políticas públicas da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.

Em seu discurso, o presidente brasileiro afirmou que a globalização neoliberal, a concentração de riqueza e as crises recorrentes e simultâneas agravaram o quadro da pobreza no mundo. Ele citou a pandemia de covid-19, que aumentou drasticamente a subnutrição, conflitos armados que interrompem a produção e distribuição de alimentos, eventos climáticos extremos, além de subsídios agrícolas em países ricos e o protecionismo que discrimina os produtos de países em desenvolvimento.

De acordo com a FAO, no Brasil, ainda há 2,5 milhões de pessoas em insegurança alimentar severa. Em 2014, o Brasil havia conseguido deixar o Mapa da Fome, no entanto, a insegurança alimentar aumentou ao longo dos anos e o país voltou a constar no relatório em 2021.

“Este é o compromisso mais urgente do meu governo: acabar com a fome no Brasil, como fizemos em 2014. Meu amigo, diretor-geral da FAO [Qu Dongyu], pode ir se preparando para anunciar em breve, ainda no meu mandato, que o Brasil saiu novamente do Mapa da Fome.

O Brasil está na presidência do G20, grupo composto por 19 países e dois órgãos regionais (União Africana e a União Europeia). Os membros do G20 representam cerca de 85% do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e serviços produzidos mundialmente) e mais de 75% do comércio mundial, e cerca de dois terços da população do planeta.

Por: Andreia Verdélio – Repórter da Agência Brasil - Brasília





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