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CIDADE
Segunda - 27 de Setembro de 2010 às 08:15
Por: Fernando Duarte A GAZETA

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Até Rio Cuiabá tem moradores à margem; próximo ao local onde deságua o Córrego 8 de Abril, existem 2 moradias
Até Rio Cuiabá tem moradores à margem; próximo ao local onde deságua o Córrego 8 de Abril, existem 2 moradias

A Prefeitura de Cuiabá desconhece a quantidade total de famílias que moram nas margens dos córregos e serão as mais afetadas com a chegada do tão esperado período chuvoso. A falta de moradias populares e a baixa fiscalização fazem com que mais casas sejam construídas em áreas irregulares. Somente no Córrego Gumitá, a estimativa é que haja 400 famílias em ambas as margens.

O meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), Hamilton Carvalho, afirma que ainda não é possível prever a quantidade de água que as próximas chuvas trarão. Mas argumenta que, a partir de outubro, os córregos poderão ser afetados com a regularidade pluviométrica principalmente nas cabeceiras dos rios, provocando até alagamentos.

"Nesse primeiro instante, podem acontecer fortes pancadas de chuva em um curto espaço de tempo ou chuvas isoladas. Molhar um ponto sem afetar o outro. Mas é certo que haverá ventos fortes e até queda de granizo, como aconteceu em São Paulo essa semana".

Uma das possíveis afetadas com as águas é a dona-de-casa Cilene Ferreira da Silva, 31. Ela mora ao lado do Gumitá há 5 meses com o marido e 4 filhos. Cilene conta que a mudança para esse local aconteceu por não "aguentar" pagar os R$ 250 em aluguel. "Quando chegamos aqui tudo estava cheio de mato e tinha muito lixo. Limpamos tudo e levantamos a nossa casa".

Cilene apresentou o local por dentro. Como não há piso, uma lona foi posta nos 2 cômodos. Em uma parte está a cozinha e um amontoado de objetos e, em outra, o quarto onde dormem 6 pessoas em 2 colchões (um estendido no chão), além da televisão. O banheiro é fora da casa e tanto a água quanto a luz são oriundas de gambiarras. "Tenho medo da prefeitura vir aqui e retirar tudo com um trator", disse Cilene. "Eu tenho medo de trator", disse o pequeno Mateus, 4.

A busca por essas regiões é tão promissora que um dos que ali mora gastou R$ 1,5 mil para montar uma pequena casa de madeira. Como forma que "garantir" o terreno público, algumas pessoas chegam ao ponto de colocar cerca. Com isso, um antigo campo de futebol amador foi obstruído.

Mesma história - O presidente da Associação de Moradores do Bairro Planalto, Israel Gonçalves da Silva, disse que já houve uma desapropriação da área em 1994, ano que aconteceu uma forte enchente e 1 pessoa morreu pela força da água.

Ainda é possível observar no lugar restos de alicerces, cercas velhas e entulhos. Israel acredita que algo semelhante possa acontecer este ano com a vinda das chuvas. "Tem muito lixo acumulado na beira do córrego. Ele vai acabar segurando a água, que não terá vazão".

Na opinião dele, enquanto o Projeto Gumitá (que prevê a reestruturação do córrego) não sair do papel, não importa quantas vezes os novos moradores sejam retirados, outros retornarão para ocupar o mesmo lugar.

Outro córrego que sente há anos a presença de invasores na sua margem é o Barbado. O bairro Castelo Branco, que é dividido por ele, nos períodos chuvosos tem as moradias em risco (muitas delas improvisadas). Uma das mais novas moradoras dali é a dona-de-casa Ilca Gomes Santos, 29. Mãe de 2 filhos, ela se mudou há 3 meses, pois "não aguentava mais morar com a minha sogra".

Ela adquiriu um terreno ao lado do córrego por R$ 1,5 mil e uma motocicleta usada. Para a mudança, Ilca solicitou a derrubada do antigo barraco, pediu para aterrar a área e construiu uma residência de alvenaria. "Aluguel é um dinheiro que não volta mais".

Até o Rio Cuiabá tem moradores à margem. Próximo ao local onde deságua o Córrego 8 de Abril, existem 2 moradias improvisadas, ocupadas por pessoas que ficam perambulando o bairro Porto, alguns alcoólatras, outros usuários de entorpecentes.

Lixo - O professor do curso de Engenharia Sanitária e Ambiental da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Rubem Mauro, afirma que as ocupações irregulares em Cuiabá e a topografia são os principais motivos para o grande acúmulo de lixo na cidade.

Mauro estima que, das 846 toneladas de lixo que irão para os córregos e rios, 40% (340 toneladas) sejam flutuantes, ou seja, garrafas plásticas, latas de alumínio, etc.

Essa enxurrada de resíduos se deve, segundo ele, a esse tipo de ocupação porque próprio morador arremessa o problema nos córregos ou simplesmente deixa o lixo em frente de casa. "Com a chuva, ele é levado para o córrego novamente. O que falta é uma gestão pública eficiente. E quando falo em gestão pública, falo de todos os entes: município, Estado e União".

O professor lembra que deve ser investido em uma coleta eficiente e no trabalho de conscientização da população. "Gastam mais dinheiro nos órgãos de imprensa mostrando que estão fazendo um grande trabalho do que em educação".

Incalculável - O diretor de Meio Ambiente da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano (Smades), Geovanne Ferreira Vasconcelos, disse que a atual situação é por causa de anos de invasões e que envolve não o atual governo, mas as gestões municipais passadas.

Segundo ele, esse tipo de ocupação já virou rotina em Cuiabá, o que dificulta uma espécie de censo desses moradores. Enquanto uma família é retirada da margem do córrego, outra assume o local e constrói uma moradia semelhante a anterior.

Geovanne conta que está fazendo um levantamento para saber o total de pessoas que invadiram as margens de córregos na Capital e espera que até outubro haja o resultado. "Se só o Gumitá tem 400 famílias, quantas não devem estar nos mais de 30 córregos que cruzam Cuiabá?"

Abrigo - O Centro Esportivo Gustavo Cid Nunes da Cunha, o chamado "Ginásio do Lixeira", por 4 anos consecutivos foi abrigo para dezenas de famílias que perderam seus bens nas fortes chuvas de Cuiabá. Somente em 2010, isso não aconteceu devido ao intenso período de seca.

Segundo um funcionário do ginásio, que não quis se identificar, outubro do ano passado foi o último mês em que as famílias estavam abrigadas. "Chegaram em 2008 e saíram dia 24 de outubro". Esse funcionário afirma que foram essas famílias as que depredaram o ginásio, que atualmente está sem energia elétrica e com os banheiros destruídos.





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