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CIDADANIA
Quinta - 23 de Julho de 2015 às 10:24
Por: Da Redação TA c/ Assessoria

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 Se uma pessoa comum precisa ultrapassar diversas adversidades ao longo da vida, os desafios impostos aos portadores de necessidades especiais são ainda maiores. Com a preocupação de contribuir para a autonomia e independência destes profissionais, a equipe da Coordenadoria de Tecnologia da Informação do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) realizou um trabalho de revisão e ampliação da acessibilidade ao sistema Processo Judicial Digital (Projudi) para deficientes visuais.

Para isso, foi feita uma parceria com o advogado do Município de Sinop (500 km ao norte de Cuiabá), Marcelo Leandro Sonntag, de 22 anos. O advogado, que perdeu a visão com apenas oito anos, teve pouquíssimo acesso ao mundo da computação antes da adolescência. Com dificuldade, conseguiu aprender informática e a navegar na internet.

E graças a tecnologias como os processos virtuais, hoje ele consegue protocolar e acompanhar processos judiciais virtualmente. Entretanto, ainda existiam algumas limitações que o impediam de fazer tudo sozinho, o que o fez procurar o Tribunal de Justiça para propor alterações no sistema.

Conforme o gerente de projetos da TI, Rafael Kloeckner, depois de uma reunião inicial e uma série de contatos telefônicos, a equipe de TI conseguiu reunir 11 apontamentos feitos por Marcelo que precisavam ser melhorados no sistema.

“Fizemos as adaptações necessárias para que o leitor de tela que ele utiliza conseguisse identificar todos os campos. Além disso, nos preocupamos com a navegação e a sequência lógica para que ele conseguisse cadastrar o processo”, afirmou o gerente de TI.

Para isso, ele conta que foi preciso estudar regras e padrões internacionais, assim como instalar a ferramenta de leitura para tentar compreender as dificuldades do advogado.

 “Foi uma experiência única para todos nós da equipe, pois nunca passamos por esta situação de vivenciar uma necessidade especial. É muito bom saber que podemos fazer a diferença na vida de alguém, especialmente do Dr. Marcelo, que tem uma história de muita luta. O Tribunal não poderia se colocar como um impeditivo para ele, mas sim como um facilitador”, garantiu Rafael.

O gerente salienta ainda que a intenção do departamento é levar acessibilidade para outras ferramentas do Tribunal, como o Portal (www.tjmt.jus.br) e o Portal Eletrônico do Advogado (PEA). “Certamente gostaríamos de continuar contando com a parceria com o Dr. Marcelo para promover essas melhorias nos nossos sistemas e ele será nosso principal cliente nesses trabalhos”, ressaltou Rafael.

Quem ficou responsável por tentar entender na prática quais eram as principais dificuldades do advogado com o sistema foi a analista de software Aryadnne Zanatta. Segundo ela, o maior desafio foi se colocar na pele de uma pessoa com deficiência visual.

“Depois de muitas pesquisas e de instalar a ferramenta de leitura que ele usa, começamos a percorrer os caminhos que o Marcelo faria para peticionar. Por várias vezes tive que ficar de olhos fechados, sendo guiada apenas pelo fone de ouvido para tentar entender quais poderiam ser as dificuldades dele”, disse.

A analista explicou ainda que uma das principais alterações realizadas foi a adaptação do sistema à ferramenta que faz a leitura da tela. “Como o leitor identifica apenas código html, alguns itens como o botão de busca era lido com um outro nome, um nome técnico. Por isso, mudamos a nomenclatura de alguns códigos para que ele pudesse entender o que estava sendo lido”, esclarece.

Para Aryadnne, o que mais marcou na realização do projeto foi o alerta em relação à acessibilidade.

“Ficamos despertos para a necessidade de pensar na acessibilidade dos sistemas para além do usuário comum. Agora, quando for testar algum software, já vamos ter essa prerrogativa”, disse.

Desejo de acessibilidade


Geraldo Ferreira dos Santos é presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Sinop (CMDPD). Ele conta que as buscas de Marcelo por acessibilidade não vêm de agora.

“Já no curso de Direito ele teve muitos entraves. E essa luta perdurou durante a execução dos trabalhos dele como advogado. E uma das questões foi a busca pela autonomia desta plataforma virtual do TJ. Essa nova geração de pessoas com deficiência que está entrando no mercado de trabalho está claramente buscando mais autonomia e conquistando acessibilidade para muitos”, afirmou Geraldo.

“A gente sabe que quando se fala em acessibilidade tudo costuma ser burocrático e envolve muitas pessoas e custos. E por isso é difícil ver empresas e instituições fazendo os ajustes necessários para dar acesso às pessoas com deficiência. Fiquei surpreso com o apoio e dedicação que a equipe do Tribunal de Justiça deu ao Marcelo, vendo de fato a necessidade dele e não apenas fazendo as adaptações. A pessoa com deficiência foi ouvida e isso é o mais importante”.

Marcelo Leandro Sonntag concorda com Geraldo. “A equipe do TJ me surpreendeu. Eles me receberam muito bem e se colocaram à disposição para solucionar o problema. A gente conversou, eu mostrei onde estavam as minhas dificuldades e a equipe já se dispôs a resolvê-las e fizeram isso com muita rapidez”, contou.

Após as alterações feitas pela TI, o advogado diz que as dificuldades que tinha antes foram sanadas.

“Foi uma melhora muito grande. É raro encontrar algum campo em que eu tenha alguma dificuldade. Antes, eu precisava chamar alguém para me auxiliar. Agora não, são coisas que eu consigo resolver sozinho utilizando o teclado. É uma alegria muito grande poder trabalhar com autonomia, sem depender de outras pessoas”, destacou.

Sobre ultrapassar as adversidades da vida, Marcelo garante que ter diferenças todo mundo tem, seja em um campo ou em outro, e que talvez os deficientes tenham realmente mais que os outros, mas que isso não é motivo pra desistir.

“Para os deficientes eu digo que para irem atrás dos seus direitos, porque vale a pena trabalhar, sentir-se realizado por fazer aquilo que gosta. E para quem não é, peço que respeite e entenda a diferença dos outros. Procurar se colocar no lugar de quem tem deficiência e não negue oportunidades para eles”, alerta o advogado.         




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