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JUSTIÇA
Terça - 25 de Agosto de 2015 às 09:34
Por: MT Noticias

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 O desembargador do Tribunal de Justiça, Rondon Bassil, negou o pedido de liberdade da ex-primeira dama de Mato Grosso, Roseli Barbosa. Ela foi presa no último dia 20, em São Paulo, pelo Gaeco, durante a Operação Ouro de Tolo.

Roseli é acusada de liderar um esquema criminosos de desvios de recursos da Setas, quando atuou na pasta, por meio de contratos e convênios com empresas de fachada.

Ela recebia 40% do valor desviado nas fraudes cometidas. Outros 36% eram devolvidos aos empresários envolvidos no esquema e 24% eram entregues a Nilson da Costa Faria e Rodrigo de Marchi, também presos na operação.

Na decisão, Rondon disse estar presente o periculum libertatis (perigo da liberdade) e por isso a manutenção da prisão se faz necessária.

“Ao examinar, atentamente, a decisão questionada neste Writ, contato que, embora, algumas razões aduzidas pela autoridade apontada como coatora, não se revelem idôneas para demonstrar a necessidade da prisão processual, outras há, que demonstram primo ictu oculi o acerto do decreto de prisão preventiva neste momento processual, justificando o receio quanto à permanência da beneficiária em liberdade”, diz um trecho da decisão.

Veja a abaixo a íntegra da decisão.

Vistos etc.

Cuida-se de Habeas Corpus com pedido de liminar impetrado em favor de Roseli de Fátima Meira Barbosa, presa preventivamente pela prática, em tese, dos crimes de organização criminosa, uso de documento falso, falsidade ideológica por inserção, peculato e lavagem de capitais, apontando como autoridade coatora o MM. Juízo da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá.

Aduzem, os impetrantes, que a prisão preventiva, a que é submetida a paciente, evidencia constrangimento ilegal, tendo-se em vista não preencher os requisitos legais exigidos para a medida extrema de privação da liberdade, considerando a inexistência de pressupostos que autorizem a segregação preventiva, aí se indicando o periculum libertatis.

Na impetração, ainda, foi registrada a existência de predicados pessoais favoráveis à paciente, bem como, a possibilidade, subsidiária, de imposição de medidas cautelares diversas da prisão.

Requer, por esses motivos, a revogação da custódia preventiva, com a eventual imposição de medidas cautelares menos gravosas que a prisão (fls. 2/24).

A inicial foi instruída com os documentos de fls. 25/424.

Eis, a síntese do necessário.

Vista às fls. 320/335-v, a decisão questionada no writ, além, de deixar em evidência provas de materialidade e indícios suficientes de autoria da paciente, também, indicou a necessidade de ser garantida a ordem pública, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da lei penal, considerando o poder político e econômico da paciente, bem como, possível reiteração delitiva, diante do lapso temporal em que perdurou a prática dos ilícitos imputados.

Pois bem. Cumpre contextualizar as imputações feitas à paciente.

Ressai dos autos, que de janeiro de 2011 a fevereiro de 2014, a paciente ocupou cargo de Secretária da Secretaria de Estado de Trabalho e Assistência Social - SETAS, período, no qual teria pedido/aceitado/recebido de Paulo Cesar Lemes "propina" no importe de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), patrocínio de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para um jantar beneficente, bem como, teria se omitido, no desempenho de seu cargo, para que Paulo Cesar Lemes, por intermédio de institutos sem fins lucrativos de "fachada", firmasse convênios e contratos ideologicamente falsos com a SETAS, desviando dinheiro público.

Estes, e outros relatos tiveram origem no Procedimento Investigatório Criminal n.º 007/2013/GAECO, e resultaram em denúncia oferecida, que foi inicialmente direcionada a este Sodalício, tendo em vista que um dos investigados possuía prerrogativa de foro, tal seja - Jean Estevan Campos Oliveira.

Todavia, com a exoneração do investigado do cargo que justificava a prerrogativa de foro, os autos foram distribuídos à 7ª Vara Criminal da Capital, sendo, a exordial acusatória, recebida em 20.3.2015, com o regular processamento do feito.

Nesse ínterim, mais precisamente, em 3.7.2015, foi oferecido, pelo GAECO, aditamento à denúncia, tendo em vista que Paulo Cesar Lemes firmou Acordo de Colaboração Premiada (fls. 344/355), indicando maiores detalhes quanto às transações ilícitas e a participação de cada envolvido.

Recebido o aditamento à denúncia, e determinado, entre outras providências, que as partes fossem cientificadas (fls. 280/285), o Ministério Público requereu fosse decretada a prisão preventiva da paciente, e de outros três investigados, posto, que o teor da delação de Paulo Cesar Lemes, a indicou como parte ativa na organização criminosa, que, inclusive, participava da divisão dos lucros do ilícito.

A pretensão ministerial foi acolhida, sendo decretada a segregação cautelar da paciente.

Nessa toada, passando à análise da pretensão defensiva, cumpre verificar o preenchimento dos requisitos exigidos no art. 312, do CPP, para a decretação da custódia preventiva.

Assim, da leitura da decisão singular (fls. 320/335-v) constate-se a prova da materialidade dos crimes de organização criminosa, uso de documento falso, falsidade ideológica por inserção, peculato e lavagem de capitais, diante do relato prestado pelo delator, que detalhadamente esclareceu como se deu o fato criminoso, bem como, apontou a participação da paciente, e de outros envolvidos, e, ainda, diante dos elementos indicados pelo Ministério Público Estadual, tanto na denúncia, quanto em seu aditamento, os quais, corroboram a existência dos crimes.

A materialidade foi registrada com a existência de anotação, em contabilidade informal localizada no escritório da empresa Mathice, também, de Paulo Cesar Lemes, do valor destinado à paciente a título de "propina", no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).

Igualmente, houve registro, de próprio punho do delator, de que os lucros ilícitos seriam rateados em 40% para Roseli, 24% para Nilson da Costa Faria e Rodrigo de Marchi, e 36 % para Paulo Cesar Lemes (fl. 366).

Outrossim, da decisão vergastada, ressaem, ainda, os indícios suficientes de autoria da paciente nos ilícitos, pois, detalhadamente, foi relatado que mesmo tendo ciência de que Paulo Cesar Lemes chefiava, por intermédio de terceiros, institutos sem fins lucrativos de "fachada", autorizava, como Secretária da SETAS, que os referidos institutos firmassem convênios e contratos, ideologicamente falsos, com a SETAS.

Ademais, o delator indicou que a paciente “era sua sócia na divisão dos lucros oriundos das verbas públicas advindas dos convênios e aderia ao esquema destinado ao escamoteamento para lavagem de dinheiro advindo da prática dos peculatos” (fl. 237).

Por outro lado, além de tais requisitos, o Diploma Processual Penal dispõe acerca da efetiva necessidade da custódia, considerando que no ordenamento jurídico pátrio, a prisão, ainda mais, quando cautelar, é a ultima ratio.
Neste ponto, é necessário lembrar que deve ser aferido o periculum libertatis, examinando-se as hipóteses em que a liberdade do acusado possa oferecer perigo, seja à ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal, ou à aplicação da lei penal.

Ao examinar, atentamente, a decisão questionada neste Writ, contato que, embora, algumas razões aduzidas pela autoridade apontada como coatora, não se revelem idôneas para demonstrar a necessidade da prisão processual, outras há, que demonstram primo ictu oculi o acerto do decreto de prisão preventiva neste momento processual, justificando o receio quanto à permanência da beneficiária em liberdade.

Neste ponto, cumpre registrar que compreendo e adoto o raciocínio utilizado, tanto pelos membros do GAECO, como pela magistrada que decretou a custódia cautelar da paciente, segundo o qual, embora, num primeiro momento, a suspensão das atividades dos institutos de “fachada” envolvidos tenha afastado a necessidade de prisão dos envolvidos no crime, com a superveniência da delação de Paulo Cesar Lemes, dando detalhes da organização criminosa, inclusive, revelando quem eram os agentes que detinham poder de decisão e que direcionavam os atos da organização, a prisão preventiva se apresentou justificável, não havendo que se falar em inexistência de contemporaneidade do fato com a custódia, eis, que os efeitos do crime ainda perdurame é evidente que seus agentes tem todo o interesse em agir para que os lucros obtidos não se esvaiam e as provas do crime não sejam descobertas.

A conclusão supra tem amparo na análise da decisão questionada, em fase de exame de pedido de liminar, que, obviamente, circunscreve-se aos fundamentos da decisão atacada e respectivos documentos que oferecem suporte à ela e a prova pré-constituída que acompanha a inicial do HC oferecida pelo impetrante.

Dessarte, questionando-se acerca da evidência dos pressupostos da prisão preventiva, verifico suficientes os argumentos expendidos quanto a necessidade de garantia da ordem pública, tendo em mente, o fato de se estar “prevenindo a reiteração e continuidade dos crimes, e só está sob cogitação diante da constatação de sua prática sistemática durante anos, que retrata a verdadeira habitualidade criminosa” (fl. 324-v).

Sem prejuízo do fato de que a paciente não mais exerce o cargo público ocupado à época dos ilícitos, como alega o impetrante (fl. 392), a magistrada a quo pontuou o justo receio quanto à possibilidade de reiterar na conduta criminosa imputada, destacando: “a extensão em concreto dos fatos delitivos também pode ser invocada como fundamento para a decretação da prisão preventiva. Trata-se de desvio milionário de verbas públicas, efetuado em várias ocasiões, durante anos a fio.” (fl. 326).

Outrossim, me parece suficiente, ao menos, em sede de liminar, a motivação para o decreto fundado no abalo à ordem pública, na medida, em que, os delitos apurados ocorreram em órgão público estadual, destinado à assistência ao trabalho e assistência social, não se limitando, a paciente, à conduta omissiva, mas, também, participando comissivamente do desvio dos recursos financeiros e, efetivamente, se locupletando com o lucro advindo da ilícita conduta, existindo até prova de que, inclusive, a paciente, exigiu para que se viabilizasse a aplicação dos recursos contrariamente à lei, que a parte lhe cabia, ou seja os 40%, lhe fossem garantidos.

Além do mais, evidenciada está a necessidade da garantia da ordem pública em face do fundamento aduzido pela autoridade apontada como coatora, de que “a notícia de que parte dessas quantias parece ter sido direcionada à campanha política de LÚDIO CABRAL, o candidato apoiado pelo então Governador do Estado, SILVAL BARBOSA, fato que por si só corrompe o regime democrático.” (fl. 327), lembrando-se que a paciente é esposa do referido ex-governador, sem falar, na denúncia de mais de 40 (quarenta) fatos criminosos, em que na maioria deles há noticia de seu envolvimento, circunstâncias que indicam a “forma corriqueira e praticamente cotidiana” (fl. 327) com que agiam os envolvidos na organização criminosa, conforme as imputações constantes na denúncia e aditamento à ela.

Da mesma forma, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da lei penal foram indicadas como afetadas com a liberdade da paciente, e demais investigados, em razão, do “poder político e econômico de que dispõem” (fl. 334).

Neste ponto, muito embora, ciente de que a investigação dos fatos imputados perdura desde o ano de 2013, que provas documentais e testemunhais já foram colhidas em procedimento extrajudicial, e, pelo que se vê do extrato de andamentos do feito no site deste Sodalício, a paciente tem comparecido aos atos do processo, ainda assim, deve ser mantida a prisão processual, pois, há na decisão atacada referência a que a paciente e os demais acusados, são pessoas diferenciadas dos agentes da criminalidade comum, uma vez, que “trata-se de crimes praticados por pessoas supra adaptadas, de projeção social inegável, poderio político destacado, exercedoras de funções proeminentes e relevantes, que não obstante isso, utilizaram-se de tais predicados para a prática de delitos cuja danosidade é muito mais ampla, já que atinge toda a coletividade e não apenas vítimas individualizáveis.” (fl. 334); ou seja, as consequencias do crime são inegavelmente graves!

Finalmente, ainda, que se questione o fato de que as atividades dos institutos sem fins lucrativos de "fachada" envolvidos nos ilícitos foram suspensas, e a paciente não mais esteja no cargo ligado aos ilícitos, necessário ponderar que as provas até então colhidas, o foram extrajudicialmente, indicando a necessidade de se assegurar que os denunciados não tomem providências, a fim, de assegurar os proveitos dos ilícitos penais que lhes são atribuídos ou, mesmo, tomar medidas com o objetivo de dificultar a colheita de provas suficientes a corroborar os termos da delação de Paulo Cesar Lemes, que como se sabe, em caso de condenação, não poderá o decreto respectivo fundar-se, exclusivamente nelas.

Assim, em se tratando de análise in limine do feito, cuja etapa exige a constatação, à primeira vista, do arguido constrangimento ilegal, decorrente de decisão em evidente afronta ao disposto no art. 93, inciso IX da CF/1988, para que seja justificado seu deferimento, suprimindo o exame do órgão colegiado, concluo não ser, o deferimento, a hipótese dos autos, frente às razões expendidas pela autoridade impetrada e que têm correspondência nos documentos examinados, satisfazendo, por ora, os requisitos e pressupostos da prisão decretada.

Quanto à possibilidade de aplicação de Medidas Cautelares diversas da Prisão, sugeridas pelos impetrantes, a decisão proferida pela autoridade apontada como coatora reconhecendo a impossibilidade de atendimento de mais esse pleito, também, se encontra suficientemente fundamentada, pois, refere-se à incapacidade de tais medidas substituírem, com eficácia, a privação da liberdade, em face, das circunstâncias e consequências dos crimes imputados à paciente e dos fundamentos aduzidos para a demonstração da necessidade da custódia processual para a garantia da ordem pública ou econômica, por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei penal.
Feitas essas considerações, indefiro a medida liminar vindicada em favor de Roseli de Fátima Meira Barbosa.

Requisitem-se as informações judiciais à autoridade apontada como coatora, que devem ser prestadas nos moldes recomendados pela CGJ, esclarecendo, ainda, se houve qualquer alteração fática, ou de direito, após a prolação do decreto impugnado.

Com as informações nos autos, colha-se o parecer da ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça.

Cumpra-se. Intime-se.

Cuiabá, 24 de agosto de 2015.

Rondon Bassil Dower Filho
Relator 





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