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Sábado - 29 de Março de 2014 às 11:52
Por: Lourembergue Alves

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Em um de seus livros, o italiano Norberto Bobbio escreveu: a democracia é “o governo do poder visível”. Nada, portanto, deve estar às escondidas, debaixo do tapete. Tudo às claras para que a população possa acompanhar as ações dos agentes públicos. Até mesmo aquelas que se dão em um fechado gabinete, pois este também é parte do patrimônio público, o qual se estende a bens, direitos, valores e princípios éticos. Estes, aliás, deveriam ser respeitados a risca. Mas o deveria, aqui, está mais próximo do ideal, e, infelizmente, muitíssimo distante do real. Vejam, por exemplo, o caso da Petrobrás, com o governo e seus seguidores procurando escamotear o que não dá mais para esconder, diante de uma oposição apagada e sem iniciativa.

Os oposicionistas, sequer, conseguem as assinaturas necessárias para a criação de uma CPI. Eles, aliás, se encontram divididos entre a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito e a simples cobrança de explicações de diligentes da empresa. Divisão que favorece a ala governista que, outro dia, era constituída de uma banda rebelde, cujo desempenho levou o governo a grandes derrotas no Parlamento. Mas, agora, como por encanto, se recolheu às trincheiras corporativistas. Pois as emendas começam a chegar a seus destinos, ainda que a conta-gotas. O que lhe pode contribuir para as eleições deste ano. Age, então, por conveniência, e também com o fim de livrar o próprio pescoço, uma vez que as denuncias respigam nos partidos que fizeram da Petrobrás, o que é pior, refém de seus interesses particulares. Isso se torna evidente quando se passam os olhos sobre os nomes dos diretores da empresa, indicados pelo PT, PMDB e PP.

Interesses partidários que se cruzam e entrelaçam com vontades coronelísticas. E, para manter essa teia de compadrios, negociatas são realizadas. Sempre em desfavor da companhia, a exemplo da compra da refinaria de Pesadena, no Texas, Estados Unidos, e da construção da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, em parceria com a PDVSA – estatal de petróleo da Venezuela. Prejuízos que se somam a outro, quase tanto quanto dilapidador, pois impede a empresa de reajustar os preços de seus produtos, com intuito de barrar o crescimento da inflação, mesmo diante do sacrifício do patrimônio da Petrobrás.

O uso desse congelamento dos preços, por si só, já é razão da manifestação do Legislativo. Afinal, cabe-lhe também a responsabilidade de fiscalização. Fiscalizar, contudo, não é bem a sua praia. Esta foi trocada por uma bastante diferente, ainda que o deixe a mercê dos desejos do governo, cuja contrapartida são cargos no Executivo para uma pequena fatia de seus integrantes e de seus apadrinhados, bem como a liberação de recursos e benefícios para os municípios onde seus cabos eleitorais estão confortavelmente instalados.

Este, infelizmente, é o retrato de um Estado sustentado pelo cartorialismo e patrimonialismo. Sustentáculos alimentadores do corporativismo e da relação coronelística. O que inviabiliza os princípios constitucionais da impessoalidade, transparência e moralidade. E isso, vale dizer, torna-se impossível a instalação verdadeiramente de um “governo do poder visível”, no dizer de Bobbio, além de inviabilizar a própria democracia.

Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: loua.lves@uol.com.br.  


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