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Sexta - 07 de Junho de 2013 às 21:24
Por: Lourembergue Alves

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Um bem público jamais deve ser utilizado para benefícios particulares. Isso é regra em qualquer Estado democrático e de direito. Não por aqui, onde se pode quase tudo, até o ir para o shopping com carros oficiais, ainda que estes mesmos tragam na porta os seguintes dizeres: “uso exclusivo em serviço”. Situação tragicômica, para não dizer outra coisa, pois nunca se viu agente público algum ser punido por utilizar o veiculo público para o divertimento da família. Ainda que fotografado. Foi a denuncia, contudo, de casos como estes que levou o prefeito cuiabano a baixar, recentemente, um regulamento, onde reforça aquilo que, em tese, já deveria ser do conhecimento de todos.

A partir de então, os automóveis da administração pública cuiabana deverão ser usados apenas “a quem esteja a serviço da prefeitura”, e, tão logo acabe o expediente ou os trabalhos, eles serão obrigatoriamente “guardados nas garagens das respectivas secretarias a que pertencem”.

Medida importante. Digna de elogios. Ainda que tomada depois da pressão externa, que contou com fotos de veículos oficiais parados à frente da padaria, enquanto o motorista aguardava o seu chefete imediato que saboreava despreocupadamente o cafezinho matinal, e até serem guinchados, a pedido dos “amarelinhos”, segundo o noticiário.

Até porque não se pode, nem deve fazer do que é público uma extensão do privado. Mesmo que seja, por exemplo, para levar e buscar as crianças da escola. O “uso exclusivo em serviço” é uma expressão significativa e bastante clara, sem que seja possível qualquer dúvida com relação a ela, ainda que esteja um tanto “batida”, “gasta”.

O “estar batida”, porém, não serve como instrumento inviabilizador do propósito público em que a dita frase parece imbuída. Não a frase necessariamente, mas quem se vale dos veículos oficiais, cujo lembrete aparece estampado, aos olhos dos contribuintes – aqueles que bancam toda a estrutura de governo, cujas contas estão inclusas as mordomias de quem usufrui da proximidade com o poder de mando.

Proximidade que faz com que alguém, ou alguns se sintam como se fossem, de fato, o todo poderoso. Mesmo que não tenham recebidos nenhuma incumbência do eleitorado, e, sequer, votados ou escolhidos para coisa alguma. Ainda assim, curiosamente, os apadrinhados ou parentes posam de “grã-finos”, com direito de usufruírem o que é público.

Daí a necessidade do olhar sempre vigilante. Agora dos cidadãos, e não mais dos simples contribuintes. Até porque nada há, ou deva existir de secreto no governo democrático. Madison, alias, via carta a seus interlocutores, reforçou o caráter público do poder, entendido como não-secreto, como aberto ao público. Tal afirmação e complementada com a frase de Carl Schmitt, a qual é elucidativa: “não existe nenhuma representação que se desenvolva a portas fechadas”.

A pergunta que se faz necessária é: como os munícipes cuiabanos irão saber se todos os carros oficiais estão sendo deixados nas garagens das secretarias? Quem vigia o vigilante das referidas garagens? Poderia ser a segunda, que logo deveria ser acompanhada por uma terceira, e, por aí vai. O importante, no entanto, é não se deixarem levar pelas ondas das desconfianças, nem pelo otimismo ingênuo de que as coisas agora serão diferentes do que sempre foram, só por conta de um regulamento, recentemente baixado. Este regulamento proíbe uma pratica imoral e ilegal, mas não molda comportamentos, e é deste último que está a necessitar, sobretudo no que diz respeito às coisas públicas, ao patrimônio publico.

Lourembergue Alves é professor universitário e articulista de A Gazeta, escrevendo neste espaço às terças-feiras, sextas-feiras e aos domingos. E-mail: Lou.alves@uol.com.br.            



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