Saulo Gouveia
Cuiabá, o Portal da Amazônia

Na década de 30, quando Várzea Grande era o terceiro distrito de Cuiabá e o Capão Grande um dos seus povoados, o Sr. Laudelino ganhava seu sustento com um singelo armazém naquela localidade. Era preciso tirar licença na inspetoria comercial para vender aguardente e, como não o tinha, o fiscal, que chegou a cavalo, ia lavrando a multa quando D. Delmira, a esposa, meteu o pé no garrafão que se espatifou todo. Sem comprovante da infração não se aplica multa.

Quando o desfile cívico era realizado na Avenida da Prainha, o banheiro de D. Dulce ficava uma penúria, pois todos os transeuntes pediam para usá-lo. Então ela requereu licença na Prefeitura de Cuiabá para reformar sua casa e providenciou o tapume para proteger. Mais tarde, após a retirada dos tapumes, os vizinhos ficaram sem entender porque a reforma não saiu.

Num dia, à beira do rio, os adultos estavam com dúvida "hoje é terça-feira ou quarta-feira?" O menino Marcelo Garcia, de quatro ou cinco anos, respondeu imediatamente: "Hoje é quarta-feira". Sabendo que o guri ainda não sabia ler, questionaram-no, por que tinha tanta certeza: "Sei por que é dia de racionamento de luz no bairro Mundéo e porque já passou o carro de coleta de lixo".

Estas três histórias verdadeiras foram tiradas do livro "Crônicas da Cidade Verde", escrito por Nilza Queiroz Freire. Ganhei esse livro de D. Vitória Mansur, uma jovem com mais de nove décadas bem vividas e dedicadas a nossa metrópole. É um livro que todos nós cuiabanos nascidos aqui, ou aqui radicados, deveríamos ler. Imperdível.

Nilza descreve sobre a inteligência do mato-grossense, destacando que não somente quem pilota nave espacial é dotado de inteligência, mas o homem comum, ao descobrir ou adaptar qualquer bem a serviço da humanidade. Diz ela: "Essa faculdade ou capacidade de aprender, apreender, compreender ou adaptar-se facilmente, é ditada pela força do seu espírito, o intelecto, que lhe dá destreza mental, agudeza, perspicácia, entre outros valores espirituais".

Concordamos. Foi por esse motivo e pela cordialidade dos cuiabanos que a Cidade Verde acatou os "paus-rodados" que aqui chegaram. Pelo civismo dos mato-grossenses de nascimento, chegarmos ao terceiro milênio morando em uma cidade acolhedora e vencedora.

Nossa Cuiabá será, se já não é, o Portal da Amazônia. Hoje já possui um desenvolvimento que não deixa a desejar aos grandes centros. É certo que falta muito ainda, indústrias e serviços, mas para quem vê o futuro, quase no presente, perceberá o potencial dessa magnífica cidade.

Lembro-me que há pouco mais de dez anos, se alguém ficasse doente, e fosse um pouco grave, o destino era São Paulo ou Rio de Janeiro. Hoje temos medicina de primeira linha e fazemos exames com equipamentos moderníssimos. Temos especialistas em todas as áreas, e poucas pessoas pegam o avião para ir tratar fora daqui.

Tanto o interior do estado, como Rondônia, Acre e o Pará mandarão seus filhos para aqui estudar. Nossas faculdades serão elogiadas, pois essa força do desenvolvimento é inestancável. Nada vai segurar e logo teremos as melhores escolas.

Tudo isso foi permitido pela inteligência emocional dos cuiabanos que aceitaram e contribuíram com aqueles que buscavam oportunidades novas, unindo-se a eles, e gerando uma nova "safra" de cidadãos. Já vemos atualmente dirigindo empreendimentos em todas as áreas, novos cuiabanos, nascidos aqui e filhos de paulistas, gaúchos, goianos, paranaenses e tantos outros estados.

Se hoje Mato Grosso é um dos mais prósperos estados da nação, um dos maiores exportadores de grãos, imaginem daqui a 20 anos. Quem persistir, poderá fazer parte dessa história, em qualquer iniciativa, privada, governamental ou até no terceiro setor.

Invistamos em Mato-Grosso, em Cuiabá, mas não esqueçamos as raízes da terra da canjica na Páscoa, ventrecha de pacu ou da cabeça de boi assada. História construída em quase 300 anos graças à nossa gente hospitaleira. Pense nisso, mas pense agora!

Saulo Gouveia (saulo@saulogouveia.net)